Caso Ágatha: Ministério Público recorrerá após absolvição de policial militar no julgamento

O MP-RJ anunciou que recorrerá da absolvição do cabo Rodrigo José de Matos Soares, responsável pelo disparo que matou a criança de 8 anos em 2019

Por Karla Souza

Na última sexta-feira (8), um júri popular, composto por cinco homens e duas mulheres, absolveu o PM Rodrigo José de Matos Soares, acusado de matar Ágatha Vitória Sales Félix. O julgamento durou mais de 13 horas e teve como desfecho a decisão favorável ao policial, que admitiu ter disparado o tiro, mas negou intenção de matar. Ágatha estava dentro de uma kombi, acompanhada da mãe, no Complexo do Alemão, quando foi atingida nas costas. O caso gerou grande repercussão e revolta, reacendendo o debate sobre violência policial nas favelas.

A versão apresentada pelos policiais foi a de que houve troca de tiros com suspeitos em uma moto. No entanto, as investigações concluíram que Rodrigo Soares teria confundido uma esquadria de alumínio com uma arma, levando-o a disparar. Diante da absolvição, o Ministério Público e o advogado da família, atuando como assistente de acusação, notificaram o juiz Cariel Bezerra Patriota de que buscarão um novo julgamento, com base no artigo 593, inciso III, do Código de Processo Penal, argumentando que a decisão foi contrária às provas apresentadas.

A defesa do policial alegou que ele estava sob forte pressão psicológica, devido à morte recente de um colega na mesma comunidade. Colegas de trabalho relataram que, na época do crime, Soares estava em estado de tensão intensa. Dez dias após o ocorrido, o PM participou da reconstituição do caso, sendo questionado sobre os momentos que antecederam o disparo. Ainda assim, o júri entendeu que não houve dolo, ou seja, intenção de matar.

Após ser indiciado, Rodrigo Soares foi afastado por três meses. Em março de 2020, retornou ao serviço, mas com restrições. A juíza Viviane Ramos de Faria determinou sua transferência para atividades internas, o mantendo afastado de funções operacionais nas ruas. A Polícia Militar informou que ele permanece afastado das ruas por decisão judicial, enquanto a Corregedoria Geral acompanha os desdobramentos do caso na Justiça.

A família de Ágatha, que aguardou por anos a responsabilização do autor do tiro que matou a menina, expressou frustração e indignação com a decisão do júri. Segundo o advogado que representa os familiares, a sentença ignora os direitos da vítima e reforça um sentimento de impunidade em casos envolvendo violência policial em comunidades periféricas. O advogado reiterou que a luta por justiça não cessará até que todas as vias legais sejam esgotadas.

O crime contra Ágatha não é isolado, mas parte de um cenário mais amplo de violência letal que atinge crianças e adolescentes, especialmente negros, no Brasil. Dados do Panorama da Violência Letal e Sexual contra Crianças e Adolescentes no Brasil, divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública em parceria com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), exibem a gravidade da situação. Entre 2021 e 2023, o país registrou 15.101 mortes violentas intencionais de crianças e adolescentes, resultando em uma média de 13,5 mortes por dia apenas no último ano. Desses jovens mortos, 83,6% eram negros, enquanto apenas 16% eram brancos. 

Esses números escancaram o impacto desproporcional da violência sobre a população negra, evidenciando a urgência de políticas que protejam as vidas nas periferias e favelas brasileiras.

Com o anúncio do recurso, a expectativa é de que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro analise o pedido em breve.

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