Texto: Divulgação
O Brasil enfrenta atualmente um cenário em que mais de 2 milhões de pessoas correm o risco de remoção forçada de suas casas. Desse total, quase 1,4 milhão são pessoas negras. Além de conviver com a ameaça de não ter onde morar, cerca de três mil brasileiros vivem em conflitos por terra e moradia. O número é destaque no novo balanço divulgado pelo movimento Campanha Despejo Zero, que reúne organizações populares, a exemplo da ONG Habitat para a Humanidade Brasil, em prol da garantia de moradias dignas para a população brasileira.
Além de cor, as ameaças de despejo e remoção forçada no país também têm gênero: 1.313.941 das vítimas são mulheres. O último levantamento, divulgado em agosto do ano passado, apontou cerca de 1,5 milhões de pessoas afetadas por despejos e remoções forçadas no país, no período de 2020 a 2024. Esses dados representam um adendo à crise habitacional sem precedentes: mais de 6 milhões de domicílios estão inapropriados para moradia (em situação de déficit habitacional) e, ao todo, são 3,5 milhões de pessoas desabrigadas e desalojadas por desastres nos últimos anos e milhares de pessoas em situação de rua.
O cenário político nacional tem colaborado para o aumento desses índices. Em um levantamento para a Campanha Despejo Zero, foram identificados 108 Projetos de Lei alinhados à pauta da Frente Invasão Zero – movimento fundado na Bahia que ficou conhecido por ações violentas contra retomada de territórios e por ter influência em instituições do Poder Legislativo, apoiando a criminalização de lutas pela terra.
Um exemplo disso é o PL 166/2023, aprovado pela Assembleia do Espírito Santos. A proposta, que inicialmente proibia ocupantes de receberem auxílios, benefícios e programas do governo estadual, foi vetada pelo governador Renato Casagrande (PSB), após parecer da Procuradoria-Geral do Estado apontar inconstitucionalidade. Já o PL 28/2024, que autoriza o poder público a realizar remoções compulsórias sem decisão judicial e prevê uso da força, quebra de sigilo de dados e punições criminais contra ocupantes, segue em tramitação, sem aprovação até o momento.
No Rio Grande do Sul, o PL 154/2023 foi aprovado e promulgado como lei, passando a proibir que ocupantes e invasores recebam qualquer auxílio, benefício ou participação em programas sociais estaduais, bem como nomeação em cargo público ou contratação com o poder público. No entanto, a legislação já é alvo de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal, que questiona a criminalização de movimentos sociais.
Situações como essas vão se repetir em Goiás, com as PLs 138/2023, 178/2023 e 256/2023, no Mato Grosso, com a Lei Estadual 12.430/2024 e em diversos outros estados ao redor do Brasil. Além das propostas legislativas, a Campanha Despejo Zero identificou outras formas de criminalização da luta por moradia, como Comissões Parlamentares de Inquérito, uso da mídia para reforçar estigmas, pressão sobre o sistema de justiça, além de intimidação e ameaça a lideranças. Trata-se de uma verdadeira arquitetura de guerra contra territórios populares.