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Apoio popular à megaoperação policial expõe contradições da segurança pública no Rio de Janeiro

Embora pesquisa aponte que mais de 80% dos moradores de favela sejam favoráveis à Operação Contenção, o cotidiano nos territórios segue marcado pela insegurança, medo e ausência de políticas públicas
Imagem: Agência Brasil

Por Jamile Novaes

Considerada um sucesso pelo governo do Rio de Janeiro, a Operação Contenção deixou mais de 120 pessoas mortas, executou 80 prisões, apreendeu dezenas de fuzis e algumas toneladas de drogas, de acordo com os dados oficiais. Poucos dias após a megaoperação realizada nos complexos da Penha e do Alemão, sob a justificativa de barrar o avanço do Comando Vermelho (CV), começaram a surgir pesquisas que indicam uma suposta aprovação popular à ação. 

Segundo o Instituto Datafolha, 57% dos moradores da capital e região metropolitana do Rio se posicionaram a favor da operação. Já os dados do instituto AtlasIntel demonstraram um índice de aprovação ainda maior, com 62,2% de respostas favoráveis na cidade e 55,2% no Brasil. Ainda segundo o mesmo instituto, a aprovação supera os 80% quando consideradas apenas as respostas de moradores de favelas da cidade e do país. 

Apesar de ser tratada por muitas pessoas e pelo governo Cláudio Castro (PL) como um marco histórico no combate ao crime organizado, a Operação Contenção também trouxe à tona questionamentos sobre o uso da força policial, a eficácia das políticas de segurança pública – sobretudo no tocante à chamada “guerra às drogas” – e a garantia dos direitos humanos para a população negra e periférica. 

Em suas redes sociais, a vereadora Thaís Ferreira (PSOL-RJ) levantou uma discussão sobre os possíveis motivos que podem justificar o apoio popular à megaoperação. Segundo ela, os números refletem a ausência de políticas públicas para as comunidades periféricas e não significam que as pessoas apoiem a morte e a violência. “Quando o Estado abandona por décadas, o caveirão e o fuzil viram o único sinal de presença. Mas operação não é presença, é um sintoma. Não garante paz, não gera renda, não protege criança, faz muito barulho, derrama sangue e no dia seguinte o crime continua o mesmo.”

A vereadora também faz um alerta para o perigo da distorção dos dados, o que segundo ela, pode servir para legitimar a violência e instalar o caos e a barbárie nas comunidades, ao invés de garantir a justiça e o direito à vida. Ela argumenta ainda que desmontar o crime só é possível com inteligência, ética e investigação limpa, cortando dinheiro na fonte. “O que a favela quer não é mais tiroteio, é ser prioridade do poder público. Quer uma polícia que proteja sem ‘esculacho’, um governo que preserva, que recupera, que cuida, escola aberta, casa sem buraco de bala, posto funcionando e justiça que também funcione”, completa.

Isabelle Braga, ativista negra e graduanda em História pela Universidade Federal Fluminense (UFF), também atribui os resultados das pesquisas à inércia do Estado e ao desgaste da população em relação às problemáticas da segurança pública. Ela tensiona ainda as motivações por trás de operações que prometem uma solução rápida para lidar com a criminalidade. “O Estado cria o problema, cria essas falsas guerras de drogas para continuar exterminando gente preta, pobre, favelada, periférica, não garantindo o básico”, critica.

A mesma pesquisa do instituto AtlasIntel que aponta o apoio popular à ação do governo, também revela a insatisfação em relação ao desempenho de Cláudio Castro na área da Segurança Pública: dentre as pessoas do Rio de Janeiro que foram consultadas, 45% avaliam como ruim ou péssimo. “É o projeto deles [políticos] mesmo, de fingir que está acabando com o problema, porque isso dá voto. Essa operação não foi do nada, ela foi muito bem planejada e organizada, almejando as eleições do ano que vem”, avalia Isabelle, que também atua como articuladora política junto à Rede de Sementes do Instituto Marielle Franco e ao movimento Mulheres Negras Decidem.

As falas de Thais e Isabelle convergem para um ponto importante: a suposta aprovação popular não necessariamente reflete um sentimento de satisfação em relação à política de segurança pública baseada no conflito armado e letalidade. Cenário reforçado pelo levantamento do Genial/Quaest, que revelou que 52% das pessoas entrevistadas se sentem menos seguros após a realização da Operação Contenção. 

No fim das contas, as próprias pesquisas também acabam revelando que a população pode até apoiar a operação, mas não percebe uma eficácia nas estratégias adotadas pelo Estado. A aparente aprovação expressa mais um pedido por respostas do que concordância com a violência. No dia seguinte às operações, além do horror, dos corpos estirados no chão, do luto, da revolta e da insegurança, não há nada que indique uma redução da criminalidade ou qualquer sinal de melhoria de vida para as favelas.

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