Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors

Série sobre os Pretos Velhos rende à fotógrafa pernambucana o Prêmio Pierre Verger

“Canjerê dos Pretos Velhos na Jurema Sagrada” é composta por 19 fotografias realizadas entre 2022 e 2025, no território afro-indígena de Paratibe, no município de Paulista (PE)
Imagem: Rebeca Andrade

Por Elizabeth Souza

Resistência. É através dessa palavra que a fotógrafa pernambucana Uenni Batista decifra sua relação com a arte da fotografia, caminho que lhe rendeu no dia 27 de novembro o Prêmio Nacional de Fotografia Pierre Verger, um dos mais prestigiados do país, com a série “Canjerê dos Pretos Velhos na Jurema Sagrada”. 

“Eu vejo essa premiação como algo muito maior do que um reconhecimento profissional. Eu acredito que ela carrega um peso simbólico”, disse em entrevista à Afirmativa. 

Essa visão, diz ela, nasce do entendimento de que a fotografia ainda é um espaço de difícil acesso, dominado por pessoas brancas, o que dificulta a trajetória de pessoas negras e periféricas na área. Buscando construir novas rotas de possibilidades, tendo sua avó como grande referência, a jovem pernambucana tem encontrado na ancestralidade e espiritualidade caminhos de manifestação, luta e expressão da arte, como revela a série premiada. 

“Se essas fotografias existem é porque as pessoas do terreiro em algum momento me acolheram como filha e também me acolheram como fotógrafa e entenderam a importância no meu trabalho e sabem que eu faço isso com muito cuidado e com muito respeito”, diz.

Vencedora na categoria Ancestralidades e Representações, a série “Canjerê dos Pretos Velhos na Jurema Sagrada” é composta por 19 fotografias realizadas entre 2022 e 2025. As imagens resultam de três anos de convivência e de registros no Terreiro Ilê Axé Oxalá Talabi, comunidade que Uenni integra, situada no território afro-indígena de Paratibe, no município de Paulista (PE), na Região Metropolitana do Recife. 

“Nossas imagens e narrativas, durante décadas, foram construídas a partir de olhares externos, muitas vezes marcadas por estereótipos e por uma visão totalmente colonial. Receber esse prêmio é como virar um pouco essa chave”, avalia a fotógrafa. “É uma forma de afirmar que eu como mulher negra posso e devo contar minha própria história, contar a história da minha comunidade, tendo autorização deles para isso e ocupar esse lugar por trás da câmera”, completa. 

De avó para neta

A fotografia chegou à vida de Uenni pelas mãos da avó e pelo afeto que atravessava cada registro. Mesmo com poucos recursos, era ela quem insistia em guardar imagens, como quem protege a própria história do esquecimento. Com o tempo, Uenni percebeu que essas memórias começavam a se apagar, perdidas entre as limitações da tecnologia e a fragilidade dos suportes onde foram guardadas. Diante da ausência de imagens de seus antepassados, nasceu o desejo de preservar o que ainda pulsava. A fotografia passou, então, a ser mais do que um ofício: tornou-se um gesto de continuidade, um exercício de resgate e uma forma de reconstruir, imagem por imagem, a própria história.

“Ela passou a vida trabalhando como empregada doméstica, mas, paralelamente a isso, era a pessoa responsável por fazer os registros fotográficos da nossa família. E a minha vontade de fotografar terreiro parte dela.”, explica Uenni.  “Então vai além do reconhecimento profissional, toca em outros lugares”.

Planos e reconhecimento

Apesar de não ter costume de planejar o futuro, Uenni revela o desejo em poder construir uma exposição fotográfica individual em 2026. Desejo que também revela um lado de quem está sempre produzindo ou planejando alguma coisa. Ritmo que ela deseja que se mantenha no próximo ano. “Eu costumo dizer que eu sou uma pessoa que estou sempre em movimento, sempre trabalhando (…) E espero que em 2026 eu esteja nesse mesmo pique, porque acredito que a partir daí que as portas vão se abrindo.”’ 

Com a premiação, Uenni passa a integrar a Exposição Coletiva e o Catálogo da 10ª edição do Prêmio Nacional de Fotografia Pierre Verger, afirmando sua presença no cenário da fotografia etnográfica e contemporânea brasileira. Ao longo do último ano, seu trabalho também ganhou novos territórios: foi convidada para a Exposição Coletiva do Prêmio Mário de Andrade, no Rio de Janeiro, participou de uma mostra coletiva no Brejo da Madre de Deus, no Agreste pernambucano, e ministrou uma formação audiovisual em terras indígenas no Acre. A vivência e a troca de saberes com povos originários atravessam e fortalecem sua produção, aprofundando o caráter antropológico de sua pesquisa.

Compartilhar:

.

.
.
.
.

plugins premium WordPress