Por Jamile Novaes
O remake da novela Vale Tudo, da TV Globo, foi alvo de críticas por conta das decisões da autora Manuela Dias em relação ao desenvolvimento da protagonista Raquel, interpretada por Taís Araújo. Diante do apagamento da personagem – que teve um papel de destaque na trama original quando interpretado por uma atriz branca – acendeu-se um debate sobre como as representações negras na teledramaturgia brasileira ainda são marcadas pelo racismo e pela ausência de roteiristas negras e negros nas decisões sobre a narrativa.
Enquanto essa discussão ganha força, uma iniciativa inédita começa a colocar os autores negros no centro da cena. Os roteiristas e diretores baianos Marcelo Lima e Tais Amordivino estão è frente da produção do documentário Histórias de Roteiristas Negros, longa-metragem que vai traçar um panorama inédito sobre o trabalho de roteiristas negros brasileiros, entrevistando profissionais de diferentes regiões e trajetórias, registrando suas contribuições para o cinema e a televisão do país.
“A motivação veio de percebermos que houve um crescente volume de roteiristas negros brasileiros entre 2020-2024 – resultados de muita luta e militância, bem como efeitos pós-George Floyd e abertura de departamentos de diversidade e inclusão em grandes empresas de mídia”, explicam os diretores.
Atualmente em fase de entrevistas e captação de imagens, os diretores iniciaram as gravações em Salvador (BA) e percorrerão os estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, destacando a atuação de 15 roteiristas, autores de grandes sucessos da teledramaturgia brasileira.
Os baianos Ceci Alves, roteirista e diretora, com séries desenvolvidas para a HBO Max e NBCUniversal; Elísio Lopes Jr., coautor de novelas da Globo e já escalado como roteirista da próxima novela das 18h; e Gildon Oliveira, autor de peças vencedoras do Prêmio Braskem e criador de obras na Rede Globo, estarão entre os entrevistados.
Com a produção do filme, os diretores esperam sensibilizar roteiristas negros e não negros sobre os dilemas vividos pela classe e, mais especificamente, sobre os desafios enfrentados por pessoas negras nesse campo. “A gente espera contribuir com maior diversidade e respeito às diferenças, em especial nos processos de contratação e trabalho colaborativo”, afirmam. Outro objetivo previsto é atingir estudantes e jovens que estão pensando na possibilidade de atuarem na área e querem entender como se estabelecer nessa carreira.
Marcelo Lima aponta que, apesar dos desafios impostos pelas relações raciais, financeiras e territoriais para o desenvolvimento profissional da classe artística na Bahia, há muita potencialidade em suas vozes. “Estrategicamente e do ponto de vista criativo, somos muito bons no que fazemos e aproveitamos todos os marcadores sociais e identitários que possuímos, não para nos fecharmos em uma bolha, mas buscar públicos cada vez mais diversos.”
Histórias de Roteiristas Negros conta com uma equipe majoritariamente negra e tem estreia prevista para abril de 2026. O filme é produzido com apoio financeiro da Lei Paulo Gustavo Bahia.


