Pesquisa mostra que para garantir educação inclusiva, professores precisam de formação continuada

Mais de 54% das pessoas com deficiência se autodeclararam negras ou pardas, conforme dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad): Pessoas com Deficiência 2022.

Por Andressa Franco

O ano de 2024 marca o aniversário dos 30 anos da Declaração de Salamanca, um marco internacional na defesa da educação inclusiva e dos direitos das pessoas com deficiência. O documento foi elaborado em 1994 durante a Conferência Mundial sobre Necessidades Educacionais Especiais, realizada em Salamanca, na Espanha, e promovida pela UNESCO.

A declaração estabelece que todas as crianças, independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, linguísticas ou outras, devem ter acesso a uma educação de qualidade dentro do sistema regular de ensino. Ela propõe que os sistemas educacionais devem ser reorganizados para incluir alunos com necessidades educacionais especiais em ambientes comuns de ensino, ao invés de segregá-los em instituições separadas. A partir da declaração, diversos países avançaram em legislações e políticas públicas de educação inclusiva.

Para marcar os 30 anos dessa conquista, foi lançada a pesquisa “Educação inclusiva e a formação continuada de professores”, do Instituto Alana. O estudo coletou dados de experiências de formação continuada para a educação inclusiva em oito países, e concluiu que oferecer formação de qualidade aos professores é fundamental para promover uma educação inclusiva em que todas as crianças e adolescentes possam aprender mais e melhor juntos, em uma mesma escola. 

A publicação ressalta que para a educação inclusiva acontecer de maneira efetiva, no chão da escola, os educadores reivindicam formação e capacitação profissional contínuas, que os apoie a desenvolver competências ao longo da carreira para agir em ambientes complexos, plurais e mutáveis.

Beatriz Benedito, analista de políticas públicas do Instituto Alana, celebra que, em 2023, foram registradas 1.8 milhão de crianças e adolescentes na educação especial, 91% delas em escolas comuns, na mesma sala de aula “como defendemos que deve acontecer e beneficiar estudantes com e sem deficiência.”

No entanto, a analista lembra que o avanço no acesso precisa ser acompanhado por avanço nas condições que as políticas educacionais oferecem a esses estudantes.

“Ainda são 94% dos professores regentes e 58% dos professores de Atendimento Educacional Especializado (AEE) sem formação continuada em educação inclusiva. É importante que as políticas de formação continuada considerem estes números na sua formulação e implementação”, explica.

Vale destacar que, conforme dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad): Pessoas com Deficiência 2022, mais de 54% das pessoas com deficiência se autodeclararam negras ou pardas. 

Além disso, o relatório “A Situação das Pessoas Negras com Deficiência no Brasil” publicado pelo movimento Vidas Negras com Deficiência Importam em 2023, mostra que apenas 0,6% das pessoas negras com deficiência conseguem acessar o ensino superior em universidades públicas do país. O estudo também revela que 42,9% das mulheres negras com deficiência estão mais vulneráveis a sofrer violência. Pessoas negras com deficiência no mercado de trabalho também representam o maior percentual que atua na informalidade (57%), contra 49% entre pessoas brancas com deficiência, segundo pesquisa encomendada pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.

Experiências internacionais 

O estudo do Alana coletou dados de experiências de formação continuada para a educação inclusiva em Buenos Aires, na Argentina; nas cidades de Maracanaú (CE), Pinhais (PR) e Santos (SP), no Brasil; na cidade de Glasgow, na Escócia; na Comunidade Autônoma Valenciana, na Espanha; e nos países Portugal e Uruguai.

Beatriz alerta que não é indicado fazer comparações entre os casos, por serem muito distintos em seus contextos políticos e de forma de organização da política educacional. No entanto, nos casos brasileiros, ela destaca o quanto os municípios enfatizaram o papel central do Ministério e das Secretarias Estaduais de Educação em coordenar ações de formação nesta agenda. 

“O que ressalta a importância de haver uma coordenação federativa e em regime de colaboração para o fortalecimento desta agenda com os profissionais que implementam a política.”

A analista também chama atenção para algumas das principais mudanças que precisam ser promovidas nos sistemas educativos para fortalecer a formação continuada de professores e a educação inclusiva:

  • A formação deve ser considerada essencial para fortalecer o projeto político-pedagógico inclusivo de toda a escola. Não deve focar apenas no aperfeiçoamento individual dos professores.
  • Deve estar conectada com a rotina das escolas e de seus profissionais.
  • Deve estimular a troca entre toda a equipe da escola.
  • Deve ser oferecida para todos os profissionais da comunidade escolar, e não apenas aos professores.
  • É importante considerar a progressão de carreira e realizar as atividades em horário de trabalho. Dessa forma, mais profissionais podem se interessar e ter condições de realizar a formação.
  • É preciso ter orçamento previsto para ações que fortaleçam a educação inclusiva, principalmente para as formações de professores e apoio à prática docente.

Acesse a pesquisa na íntegra aqui.

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