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Racismo online atinge número recorde de denúncias, mostra pesquisa

Entre os grupos mais vulneráveis, as mulheres negras são as maiores vítimas de racismo online
Imagem: Freepik

Texto: Divulgação

O ano de 2024 registrou o maior número de denúncias de racismo e injúria racial online no Brasil. É o que mostra o estudo “Brasil, mostra tua cara: Retrato das vítimas de racismo online e anonimato de agressores”, realizado pelo Aláfia Lab a partir de uma análise inédita de denúncias destes crimes registradas no Disque 100 (Direitos Humanos) entre os anos de 2011 e 2025. 

Foram 452 casos só no ano passado. Destes, 90% foram denunciados por pessoas negras, enquanto 70% dos agressores eram pessoas brancas, e 55% homens. Pessoas de pele retinta tendem a ser os alvos mais frequentes do racismo fora do âmbito das redes sociais. Dentro delas, a realidade não é diferente, pois dessa porcentagem, 66% das pessoas se afirmaram pretas. Já na maior parte dos casos em que a cor e o gênero foram informados, as mulheres representaram 61% das vítimas, enquanto os homens totalizaram 37% dos denunciantes. 

Na análise temporal das denúncias, constatou-se que entre 2011 e 2019 houve estabilidade no número de casos, com exceção de 2015, que acumulou 137 registros. A partir de 2020, entretanto, o canal Disque 100 começou a registrar sucessivos recordes anuais: foram 218 denúncias em 2020, 200 em 2021, 215 em 2022, saltando para 315 em 2023 e chegando a 452 em 2024. É provável que este ano haja um novo recorde, uma vez que, apenas nos três primeiros meses, o canal de denúncias já havia registrado 88 casos.

A faixa etária da maior parte das vítimas (27%) concentra-se entre 25 e 30 anos. Os dados revelam um índice preocupante de vítimas jovens. Entre crianças e adolescentes de 0 a 17 anos, os registros corresponderam a 13,38% dos casos, evidenciando a necessidade urgente de proteção desse grupo no ambiente digital. 

Em uma análise mais aprofundada dos dados do Disque 100 sobre racismo digital, expõem-se as nuances da interseccionalidade. Para homens negros, a violência se manifesta predominantemente por meio de outros homens (68% dos casos), indicando um padrão de agressividade pautada por uma masculinidade tóxica e distorcida. Já para as mulheres negras, a agressão não tem um único rosto: 55% partem de outras mulheres, e 45% de homens. Segundo a pesquisa, esse dado é crucial, pois demonstra que a mulher negra está vulnerável tanto ao machismo quanto ao racismo, que pode vir de qualquer direção. 

O levantamento também analisou os estados brasileiros com maior volume de denúncias. Por se tratar de um estudo que destaca registros de agressões ocorridas em ambientes online — incluindo redes sociais, aplicativos de mensagens, fóruns e outras plataformas digitais —, não foi possível localizar com exatidão a origem das agressões.

Dessa forma, os registros indicam o local de onde a vítima realizou a denúncia. Em primeiro lugar, está São Paulo, com 248 denúncias, seguido por Rio de Janeiro (178), Minas Gerais (121) e Bahia (66). Entre os motivos apresentados para o destaque desses estados, estão não apenas o fato de serem os mais populosos do Brasil, mas também um possível maior acesso à informação ou ao canal de denúncia por parte de suas populações.

A análise combinada de gênero, raça e faixa etária das vítimas revela padrões significativos de vitimização. A maior parte das vítimas é do gênero feminino, com destaque para mulheres pretas na faixa de 25 a 30 anos, que correspondem a 10,56% do total. Na sequência, aparecem as faixas etárias de 31 a 40 anos (8,95%) e de 18 a 24 anos (8,85%). Juntos, esses três grupos concentram 28,34% das vítimas com dados completos, evidenciando uma notável incidência de violência racial contra mulheres pretas jovens e adultas.

Mudanças no Disque 100 no decorrer dos anos fizeram diferença

Entre 2011 e 2025, o Disque Direitos Humanos – Disque 100, serviço de utilidade pública vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, passou por significativas transformações que influenciaram diretamente o volume, a natureza e a forma de registro das denúncias, especialmente no ambiente online. 

Criado inicialmente para receber denúncias de violência contra crianças e adolescentes, o Disque 100 teve sua atuação significativamente ampliada em 2011, com a instituição da Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos (ONDH). A partir de então, o serviço passou a acolher também relatos envolvendo outros grupos vulneráveis, como pessoas idosas, pessoas com deficiência, população LGBTQIA+, vítimas de tráfico humano, trabalho análogo à escravidão, violência institucional e casos de racismo. A partir de 2019, o canal incorporou ainda novos meios de recebimento de denúncias, como aplicativos móveis, plataformas online e redes sociais, o que viabilizou um aumento significativo no registro de casos de violência e discriminação em ambientes virtuais.

Contudo, o Disque 100 também enfrentou mudanças administrativas e ideológicas que impactaram diretamente sua atuação. Entre 2019 e 2022, durante o governo de Jair Bolsonaro, o serviço foi alvo de questionamentos sobre sua efetividade, transparência e imparcialidade. Houve denúncias de engavetamento de casos, enfraquecimento do uso dos dados para formulação de políticas públicas e a invalidação de denúncias relacionadas a questões raciais e de gênero. Um exemplo emblemático foi a exclusão da categoria “discriminação religiosa” do canal de denúncia.

A partir de 2023, com a transição de governo, o Disque 100 iniciou um processo de reestruturação institucional, orientado pela retomada da escuta qualificada de grupos historicamente marginalizados, pelo reforço à transparência e pelo reconhecimento dos dados como fundamentais para a elaboração de políticas públicas.A pesquisa completa pode ser acessada aqui.

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