Por Karla Souza*
Ser ameaçado, assediado, tratado com menos respeito. Receber atendimento inferior. Ser seguido em lojas. Situações como essas, comuns para quem é preto no Brasil, foram reunidas em uma pesquisa nacional que revelou um dado alarmante: 84% da população preta já sofreu discriminação racial. O estudo, apoiado pelo Ministério da Igualdade Racial e conduzido pelas organizações Vital Strategies Brasil e Umane, é o primeiro a aplicar no país a escala de discriminação cotidiana com abrangência nacional.
O levantamento foi realizado entre agosto e setembro de 2024, com mais de 2 mil participantes. As perguntas, aplicadas online, mediram desde a frequência de atitudes desrespeitosas até experiências explícitas de racismo. Entre os negros entrevistados, 81,6% afirmaram ser tratado com menos respeito em comparação a outras pessoas. Contrastando com esse dado, 9,7% responderam que passam pela mesma situação.

Os recortes de gênero revelam um cenário ainda mais desigual. Entre as mulheres pretas, 72% relataram ter vivenciado mais de um tipo de preconceito. A gerente de Investimento e Impacto Social da Umane, Evelyn Santos, aponta que esse foi um dos resultados que mais chamaram atenção.
Homens pretos aparecem logo em seguida, com 62,1% relatando múltiplos tipos de preconceito. Na população branca, os números são menores: 30,5% entre as mulheres e 52,9% entre os homens. Os dados reforçam a importância de pensar políticas públicas com um olhar interseccional, que reconheça as especificidades das experiências de opressão enfrentadas por mulheres negras.
A pesquisa dialoga com outros indicadores de desigualdade racial. O Atlas da Violência mostra que pessoas negras têm 2,7 vezes mais chances de serem vítimas de homicídio. Já o Censo 2022 apontou que negros compõem 72,9% da população que vive em favelas. No mercado de trabalho, a taxa de desemprego entre pessoas negras (16,4%) segue acima da registrada entre brancos (5,6%). Esses números desenham um país onde a cor da pele segue sendo determinante no acesso à vida e ao Bem Viver.
Para Pedro de Paula, diretor da Vital Strategies Brasil, os resultados da pesquisa não devem ser tratados como novidade, mas como evidência. “A gente sabe que tem muito mais violência obstétrica com mulheres negras do que com mulheres brancas, A gente sabe que tem muito menos acesso, muito menos dispensação de analgesia e outros tipos de medicação para a população preta”, afirma. Ele também defende que toda instituição com atuação social tem a responsabilidade de enfrentar essa estrutura desigual, especialmente no campo da saúde, onde o racismo também impacta quem vive e quem morre.
*Com informações da Agência Brasil