[et_pb_section bb_built=”1″ admin_label=”section” next_background_color=”#000000″][et_pb_row admin_label=”row” background_position=”top_left” background_repeat=”repeat” background_size=”initial”][et_pb_column type=”4_4″][et_pb_text background_position=”top_left” background_repeat=”repeat” background_size=”initial” _builder_version=”3.17.6″]
Este artigo pretende colaborar com as reflexões de companheiras e companheiros sobre o cenário político nacional. As reflexões são fruto do olhar de uma mulher negra ativista que há quase quarenta anos mergulha no trabalho de construção de uma sociedade plurirracial e democrática, como anuncia Abdias Nascimento, no livro O genocídio do negro brasileiro (1978): “Ou ela é democrática para todas as raças e lhe confere igualdade econômica, social e cultural, ou não existe uma sociedade plurirracial e democrática”. A reflexão de Abdias, publicada há 40 anos, aponta a manutenção dos privilégios da branquitude como o principal entrave para a democracia brasileira.
Vivemos um momento estratégico para refletir a situação da população negra no Brasil e a construção de uma sociedade brasileira realmente democrática para todos os seguimentos étnicos e raciais que a compõe. Recentemente, setores da esquerda têm enfatizado que as dificuldades enfrentadas pela população negra se estabeleceram a partir do golpe contra o governo da presidenta Dilma Rousseff, isso não é verdadeiro.
Ao longo da história desse país, intelectuais e ativistas negras/os foram silenciados por grupos de poder entre conservadores e progressistas. Experimentamos no Brasil um modelo de direita onde se elege o filho, o neto, a mulher, o irmão e os amigos do que já estão em espaços de representação institucional e política. Esta direita é latifundiária, herdeira de escravizadores nos engenhos coloniais, eles detêm o monopólio das comunicações, são bélicos e promovem o discurso de segurança atrelado às armas, se atualizam com o fundamentalismo cristão, e são nossos inimigos históricos. Por outro lado, a esquerda não forjou um processo democrático na construção das lideranças. É uma esquerda forjada na concepção de sindicalismo em uma nação que 54% da população nunca teve escola de qualidade e nem trabalho formal. Esta esquerda sempre terá problemas para pensar a transformação eficaz da realidade do país.
A feminista negra, doutora em filosofia, Sueli Carneiro, trouxe há alguns anos uma reflexão bastante aplicável aos nossos dias, sobre a nossa participação nas fileiras dos partidos. Ela afirma em alto e bom tom que “entre direita e esquerda, nós somos negros”, expondo o trato dispensado a nós pelos partidos políticos no Brasil, inclusive de esquerda, que muitas vezes reforçam as lógicas de subalternidade negra.
Nesta mesma direção, a também feminista negra Lélia Gonzalez reforça a crítica no artigo Racismo Por Omissão, publicado na Folha de São Paulo, em 1983, ao tornar pública a importante crítica ao programa eleitoral do Partido dos Trabalhadores: “O PT na TV tratou dos mais graves problemas do país, exceto um, que foi ‘esquecido’, ‘tirado da cena’, ‘invisibilizado’, ‘recalcado’. É a isto, justamente, que se chama de ‘racismo por omissão’… não só fazendo ‘a cabeça’ das elites ditas pensantes quanto das lideranças políticas que se querem populares, ‘revolucionárias’”. (GONZALEZ, 2014, p. 85)[1].
Na história do Brasil esta não é uma perspectiva nova. Em todos os momentos de disputa política que nos tire do lugar de subalternidade encontramos entraves de brancos de todos os lados. Em todos os momentos que pensamos em avanços nos projetos que pode criar rupturas no status quo, a sociedade brasileira se levanta em posição contraria a possibilidade de alcançarmos lugares de equidade. Nós negros, até hoje não conseguimos construir alianças e pactos na sociedade que dessem conta de fortalecer nosso protagonismo, e sempre estivemos atentos e participativos a todos os processos políticos nacionais – nos partidos e movimentos sociais de todas as frentes.
A crise que vivenciamos é também resultado da atitude racista e excludente dos setores em geral da esquerda branca em silenciar o que o movimento negro brasileiro afirma há pelo menos 40 anos: não existirá democracia de fato sem a efetiva participação política negra. Lélia Gonzalez escreveu em 1985 que “enquanto a questão negra não for assumida pela sociedade brasileira como um todo: negros, brancos e nós todos juntos refletirmos, avaliarmos, desenvolvermos uma práxis de conscientização da questão da discriminação racial, vai ser muito difícil o Brasil chegar ao ponto de efetivamente ser uma democracia” (GONZALEZ, 1985, p. 01). Como costumo expor nas minhas apresentações, a esquerda brasileira sempre manifestou a má vontade, a cegueira e a surdez intencional sobre as questões levantadas pelo movimento e intelectuais negros.
Os mais de 12 anos de governo petista na presidência foram fundamentais para a promoção de direitos sociais que beneficiou diretamente a população negra, mas nunca se matou tantos jovens negros em nossas comunidades, o assassinato de mulheres negras também aumentou, o genocídio contra a população negra que denunciamos há décadas se intensificou no governo que nós ajudamos a eleger. Hoje, qualquer aliança entre as esquerdas só será possível despois de respondermos a pergunta: como chegamos a esta proporção de banalização das vidas e mortes negras? Foco minha crítica à esquerda partidária, pois como apontei no início do texto, a direita é nossa inimiga histórica. Mas o povo negro sempre construiu a esquerda brasileira.
Podemos identificar com tranquilidade e felicidade a força e diversidade do movimento negro brasileiro. Somos o povo de santo, que tem de forma emblemática reagido contra o racismo religioso; são os quilombolas, com a coragem vital da coletividade na luta pelo direito à terra; é a juventude negra, que mesmo sendo dizimada ressurge cotidianamente nos saraus e slams de poesia, batalhas de rap, no grafite, no hip hop, no empoderamento crespo, comunicadoras (es), jornalistas, cineastas, nos movimentos de liberdade sexual, nos grupos de secundaristas ou estudantes universitários e nas articulações de negras jovens feministas – ou seja, a juventude vem insistentemente forjando formas de vida, negando a morte e a marginalização engendrada pelo racismo.
O movimento negro nunca foi e jamais será único, mas sempre foi e sempre será essencialmente insurgente e revolucionário. É necessário evidenciar que os chamados setores progressistas se apropriam do nosso discurso, fantasiam e esvaziam de sentido as nossas lutas. Traduzem as lutas em frases de efeitos para utilizar em suas faixas e bandeiras, mas não aprofundam com seriedade para transformar a sociedade brasileira.
Grupos negros que agem a partir da subalternidade branca, e trata a população negra como “base” não são movimentos libertários. Os partidos não serão libertários para o povo negro enquanto não entender o combate ao racismo como estruturante para mudar o país.
Acreditamos que outro mundo é possível. Queremos dialogar com as diferentes perspectivas, mas é preciso que o modelo e o formato de construção de alianças sejam modificados. É preciso constituir outras formas de organização porque os partidos políticos e a chamada democracia representativa tem prazo de validade.
Pensar alianças para enfrentar o racismo e construir um novo modelo civilizatório tem sido um dos grandes desafios da luta negra. Esta conjuntura é favorável para que possamos fazer uma reflexão mais profunda da sociedade e das relações constituídas a partir dela. É preciso ter respeito pela construção que foi feita pelo movimento negro. Precisamos reagir não apenas a apropriação cultural, de território, mas também é necessário reagir a apropriação da nossa humanidade. Não nos salvaremos se não tivermos a capacidade de fazer uma reflexão profunda.
Por isso que nós, negras e negros, precisamos nos juntar em alianças que verdadeiramente enfrentem o racismo e o sexismo, sem concessões, nem entre nós… Como bem disse Steve Biko, hoje e sempre: “Estamos por nossa própria conta”. Que as reflexões nos ajude a ler o contexto e apontar caminhos na atual conjuntura politica.
[1] Citação retirada do texto “O Sonho não Acabou – Para Sempre Lélia Gonzalez” de Rosália Oliveira Lemos.
[/et_pb_text][/et_pb_column][/et_pb_row][/et_pb_section][et_pb_section bb_built=”1″ fullwidth=”off” specialty=”off” transparent_background=”off” allow_player_pause=”off” inner_shadow=”off” parallax=”off” parallax_method=”off” padding_mobile=”off” make_fullwidth=”off” use_custom_width=”off” width_unit=”on” make_equal=”off” use_custom_gutter=”off” custom_padding_tablet=”50px|0|50px|0″ custom_padding_last_edited=”on|desktop” prev_background_color=”#ffffff” next_background_color=”#000000″][et_pb_row background_position=”top_left” background_repeat=”repeat” background_size=”initial”][et_pb_column type=”1_4″][et_pb_image admin_label=”Foto de Jéssica Ipólito” src=”https://revistaafirmativa.com.br/wp-content/uploads/2018/12/valdecyr.jpg” use_border_color=”off” _builder_version=”3.17.6″ /][/et_pb_column][et_pb_column type=”3_4″][et_pb_text admin_label=”Jéssica Ipólito” use_border_color=”off” background_position=”top_left” background_repeat=”repeat” background_size=”initial” _builder_version=”3.17.6″]
Valdecir Nascimento
Historiadora, mestre em educação e coordenadora executiva do Odara Instituto da Mulher Negra. Compõe a coordenação executiva da Articulação de Mulheres Negras Brasileiras (AMNB) e do Fórum de Promoção de Igualdade Racial (FOPIR).
[/et_pb_text][/et_pb_column][/et_pb_row][et_pb_row background_position=”top_left” background_repeat=”repeat” background_size=”initial”][et_pb_column type=”4_4″][et_pb_text use_border_color=”off” background_position=”top_left” background_repeat=”repeat” background_size=”initial” _builder_version=”3.17.6″]
Mais de Valdecir Nascimento
[/et_pb_text][et_pb_blog fullwidth=”off” posts_number=”6″ include_categories=”12″ show_thumbnail=”off” show_more=”on” show_author=”off” show_date=”off” show_categories=”off” show_pagination=”off” use_border_color=”off” _builder_version=”3.17.6″ /][/et_pb_column][/et_pb_row][/et_pb_section]