Por Patrícia Rosa*
Nesta sexta-feira (14), manifestantes foram às ruas pelo país em ato contra o Projeto de Lei 1904/2024, que equipara o aborto após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio. O texto equipara o aborto de gestação acima de 22 semanas a homicídio, em casos de pessoas que tenham direito ao aborto legal no Brasil, inclusive em casos de gestação resultante de um estupro.
Houve protestos em, Salvador (BA), Porto Alegre (RS), Curitiba (PR) e Belém (PA). Na noite da última quinta-feira (13), manifestantes foram às ruas em capitais como São Paulo (SP), Brasília (DF), Manaus (AM), Florianópolis (SC) e Rio de Janeiro (RJ). Outras capitais do país marcaram atos para este fim de semana, como João Pessoa (PB), neste sábado (15) pela manhã.
No domingo (16)
- Campo Grande (MS), na Avenida Afonso Pena, com 14 de Julho, às 09 horas:
- Fortaleza (CE), na Praça do Ferreira, a partir das 8 horas.
Na próxima segunda-feira (17):
- Recife(PE), na Praça do Derby, às 16 h.
Lira tenta minimizar
Diante da repercussão e das críticas ao PL, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), tentou minimizar a situação, nesta quinta-feira (13) em entrevista à imprensa.
“O sentimento da Casa não é para avançar para liberação do aborto e também não é para descumprir os casos que já são permitidos hoje em lei”. O deputado também declarou que uma parlamentar mulher de uma “ala moderada”, seria escolhida como relatora do projeto.
A urgência para levar o texto diretamente a plenário foi aprovada, na noite desta quarta-feira (12), na Câmara dos Deputados.
Atualmente, são três os casos em que a interrupção da gravidez é permitida no país: gravidez decorrente de estupro, risco de morte à gestante ou em caso de anencefalia do feto. Sendo os dois primeiros permitidos desde 1940. Assim, o PL ataca um direito que já enfrenta diversas barreiras para ser plenamente acessado, especialmente para as meninas e mulheres negras, pobres e vulnerabilizadas.
O projeto de autoria do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), que altera o Código Penal, caso aprovado, pretende aumentar a pena máxima para quem realizar o procedimento, de 10 para 20 anos. No momento da votação, Arthur Lira chegou a mencionar o número do projeto, mas não anunciou no microfone que a votação estava aberta. A votação durou apenas 24 segundos. Com o avanço, o PL poderá ser votado diretamente no Plenário, sem passar antes pelas comissões da Câmara.
“Achamos que esse regime de urgência precisava ficar registrado, porque é um ataque muito grande às meninas brasileiras”, declarou a deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS). O parlamentar Chico Alencar (PSOL-RJ) também se manifestou sobre como a votação foi regida. “Fui ali atrás, quando voltei, fui informado que um projeto foi deliberado em sua urgência sem que quase ninguém percebesse.”
O Observatório de Justiça Reprodutiva do Nordeste, divulgou uma nota em suas redes sociais explicando a gravidade da aprovação da PL, como a obrigatoriedade de meninas grávidas vítimas de estupro a seguirem a gestação, negligenciando os impactos físicos e psicológicos, o retrocesso os direitos sexuais e reprodutivos e a criminalização de mulheres.
“PL da Gravidez Infantil representa retrocesso na garantia de direitos reprodutivos para meninas, mulheres e pessoas que gestam. Afeta diretamente os direitos dessas meninas, que passariam a ser obrigadas a levar a gestação fruto de um estupro adiante, o que muitas vezes já acontece, tendo em vista que a dificuldade no acesso ao aborto legal”, afirmou o observatório..
Para a enfermeira, especialista em obstetrícia e doutora em saúde pública pela USP, Alaerte Leandro Martins, o resultado da possibilidade da aprovação do Projeto de Lei é o retrocesso aos direitos sexuais e reprodutivos.
“O que podemos esperar desse PL, caso aprovado, é a barbárie, o cúmulo do machismo no país, um grande retrocesso que a gente vem lutando há anos, primeiro pela descriminalização do aborto. Não é possível que seja aprovado e que a gente continue tendo meninas parindo, em consequência, com toda certeza, de estupro”, afirma.
Segundo dados da 17ª edição Anuário Brasileiro de Segurança Pública, no ano de 2022 ocorreram 74.930 casos de estupro em 2022, os estupros de vulnerável, quando a violência sexual praticada contra menores de até 14 anos, representam 56.820 casos. O estudo ainda aponta que 57% das vítimas, são meninas negras.
Alaerte lembra que o Código Penal brasileiro criminaliza toda e qualquer conjunção carnal ou ato libidinoso com menores de 14 anos, com pena de reclusão de 8 a 15 anos.
“Inadmissível isso, muitas correm risco de vida, não só essa criança de 10 a 14 anos, além das consequências dessa gravidez. Quem vai assumir essa criança? Essa criança corre sério risco tanto de mortalidade como de morbidade.”
*com contribuições de Andressa Franco