Por Catiane Pereira
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) foi condenado nesta terça-feira (16) pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) a pagar R$ 1 milhão em indenização por danos morais coletivos, em razão de declarações racistas feitas em 2021 contra um apoiador negro. Na ocasião, Bolsonaro comparou o cabelo crespo do homem a um “criadouro de baratas”. A decisão foi unânime entre os desembargadores da 3ª Turma.
Além da indenização, o tribunal determinou que Bolsonaro retire os vídeos de suas redes sociais e faça retratação pública dirigida à população negra em veículos de imprensa e em suas próprias plataformas digitais. A União também foi condenada ao pagamento do mesmo valor por danos coletivos, já que na época Bolsonaro era presidente.
Segundo o relator do processo, desembargador Rogério Favreto, as falas do ex-presidente configuram “racismo recreativo”, prática em que manifestações discriminatórias são disfarçadas de brincadeira ou humor. Para ele, não se tratou de mera piada de mau gosto, mas de “ofensa racial que atinge a honra e a dignidade de pessoas negras e perpetua um processo de desumanização”.
A Justiça Federal havia rejeitado inicialmente a ação, sustentando que as falas, ainda que ofensivas, não atingiram a população negra de forma geral. O Ministério Público Federal (MPF) recorreu, e o caso foi reavaliado pelo TRF-4, que reformou a sentença.
Na decisão de segunda instância, os magistrados destacaram que a posição do então presidente da República torna as manifestações ainda mais graves, pela capacidade de reforçar estigmas racistas e legitimar práticas discriminatórias.
A defesa do ex-presidente argumentou que se tratava de “comentários jocosos” sem intenção de ofensa e ressaltou que o apoiador não se declarou vítima de racismo. O tribunal, no entanto, entendeu que o caso ultrapassa o âmbito individual, por incidir sobre a coletividade negra.
Histórico do caso
As declarações ocorreram em maio de 2021, em frente ao Palácio da Alvorada, durante interação de Bolsonaro com apoiadores. Rindo, ele disse a um homem negro: “Tô vendo uma barata aqui” e “o que você cria nessa cabeleira aí?”. Em julho do mesmo ano, durante uma live, voltou a debochar do cabelo do mesmo apoiador, afirmando que era um “criadouro de baratas”.
O homem alvo das falas declarou, na época, que não se sentiu ofendido. Mesmo assim, 54 defensores, promotores e procuradores entraram com ação civil pública, acatada pelo Ministério Público Federal (MPF). O grupo argumentou que, independentemente da reação individual, as declarações tiveram impacto discriminatório coletivo, por transformarem o cabelo crespo em alvo de zombaria.
Outros processos
A condenação ocorre em meio a outros julgamentos envolvendo Bolsonaro. Na última quinta-feira (11), a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) condenou o ex-presidente a 27 anos e três meses de prisão em regime inicial fechado pela participação em uma trama golpista. A execução da pena depende do julgamento de recursos.