Por Catiane Pereira*
A Escola Municipal de Ensino Infantil (EMEI) Antônio Bento, no Caxingui, em São Paulo (SP), foi alvo de uma ação policial na tarde de 12 de novembro, após o pai de uma aluna afirmar que sua filha de quatro anos estaria sendo “obrigada a ter aula de religião africana” por ter feito um desenho da orixá Iansã. Quatro policiais militares entraram armados na unidade, um deles portando uma metralhadora, e circularam pelo prédio por mais de uma hora, segundo relatos de funcionários e responsáveis.
A atividade escolar fazia parte do currículo antirracista adotado pela rede municipal, com base no livro Ciranda em Aruanda, de Liu Olivina, integrante do acervo oficial da Secretaria Municipal de Educação. A proposta envolvia leitura e produção artística livre, prevista pelas leis federais 10.639/2003 e 11.645/2008, que tornam obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira e indígena.
Um dia antes da presença dos policiais, o pai havia rasgado um mural de desenhos produzidos pelas crianças. Na ocasião, foi orientado pela equipe a registrar sua reclamação nos canais institucionais e participar do Conselho de Escola.
A diretora da escola, Aline Aparecida Floriano Nogueira, relatou ao portal Alma Preta ter sido coagida pelos policiais durante a abordagem. Segundo documento interno enviado à comunidade escolar, os agentes chegaram em três viaturas, tentaram entrar pela portaria, foram contidos, e posteriormente acessaram o prédio armados pela área dos fundos. Aline, que é uma mulher negra, afirmou que tentou explicar que a atividade não tinha caráter religioso, mas foi interrompida e acusada de estar “nervosa”.
“Me senti vulnerável. Ainda havia crianças na escola e famílias chegando para reunião. Solicitei a presença da supervisão”, descreveu. Ela se afastou das atividades após o episódio e não deve retornar à direção neste ano.
Pais de alunos também relataram que a abordagem foi “grosseira” e “hostil”, e disseram acreditar que os policiais não eram do batalhão da região. Toda a ação foi registrada pelas câmeras da escola e as imagens foram disponibilizadas às autoridades.
Em nota enviada à imprensa, a Diretoria Regional de Educação (DRE) Butantã repudiou o episódio, afirmou que a EMEI Antônio Bento atuou dentro da legislação e destacou que o trabalho pedagógico não possui caráter doutrinário. A instituição reforçou que experiências relacionadas à diversidade cultural fazem parte da formação cidadã prevista no currículo.
A Secretaria de Segurança Pública (SSP) informou ao G1 que a Polícia Militar instaurou procedimento para apurar a conduta da equipe que esteve na escola, incluindo análise das imagens das câmeras corporais dos agentes. A pasta disse também que uma professora da unidade registrou boletim de ocorrência contra o pai da aluna, por ameaça. Policial militar da ativa, ele nega ter danificado o mural.
O 34º Distrito Policial (Vila Sônia) avaliará se a servidora deseja formalizar representação criminal. Caso isso ocorra, será aberto inquérito.
Moradores da região, responsáveis de alunos e organizações locais elaboraram um abaixo-assinado em apoio à escola e denunciaram a atuação dos policiais como “errônea e racista”. O documento defende a continuidade da educação antirracista e repudia qualquer forma de intolerância religiosa, racismo ou discriminação.
*Com informações da Alma Preta e G1


