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Diálogos Globais por Reparação e Bem Viver reúne mulheres de mais de 30 países na UnB

Encontro internacional reuniu mulheres negras de mais de 30 países na UnB para fortalecer estratégias globais de reparação, justiça racial e Bem Viver às vésperas da Marcha das Mulheres Negras em Brasília
Imagem: Lissandra Pedreira

Por Jesz Ipólito e Elizabeth Souza

O sol ainda disputava espaço com as nuvens quando as primeiras mulheres começaram a chegar ao salão circular do Centro de Excelência em Turismo da UnB. Era cedo, mas Brasília (DF) já vibrava em outra frequência: uma mistura de reencontros, sotaques cruzados, risos que se reconhecem, abraços que se reencontram antes mesmo de se anunciar. Espanhol, inglês, francês, português –  e aquele idioma ancestral que só o sorriso e o toque conseguem traduzir.

Assim começava, no dia 22 de novembro, a programação dos Diálogos Globais por Reparação e Bem Viver, parte da Semana por Reparação e Bem Viver, iniciativa do Comitê Impulsor Global da Marcha das Mulheres Negras por Reparação e Bem Viver, formado por integrantes de mais de 37 países. 

Mais de 60 atividades espalhadas pela capital federal transformaram a cidade em um território de circulação de ideias, estratégias e afetos. O propósito é comum: fortalecer a luta por reparação, justiça social, equidade e Bem Viver – conceito que reconhece a interdependência entre ambiente, território, coletividade e cuidado com a vida em todas as suas dimensões.

A proposta dos Diálogos Globais é abrir espaço para trocas profundas entre mulheres negras de diferentes realidades como Brasil, Colômbia, Argentina, Guiné-Bissau, Estados Unidos, Chile, Equador, Paris, Panamá e tantos outros territórios onde a luta é semelhante, ainda que marcada por contextos distintos. Cada uma delas carrega sua própria história de enfrentamento, mas encontra uma base comum: a mesma maquinaria global de desigualdades que recai, de formas diversas, sobre as vidas negras.

Vamos tomar esse mundo nas mãos”

A abertura do encontro aconteceu no sábado (22) e foi conduzida por Valdecir Nascimento, do Odara – Instituto da Mulher Negra. Sua fala, atravessada pela força das orixás, ecoou como alicerce espiritual e político. “Hoje a gente tem que saudar Oxum, saudar Nanã, saudar todas as orixás femininas que fazem com que a gente esteja aqui, que nos empurram e nos acalentam a cada dia.”

Valdecir lembrou que a luta das mulheres negras não se sustenta somente na técnica ou na política formal, mas também na espiritualidade que fortalece, protege e equilibra. “Que Iemanjá cuide do nosso ori, porque é muita luta que a gente trava no dia a dia. Que Iansã, com seus ventos fortíssimos, faça com que a mensagem que queremos apresentar ao mundo ecoe em cada lugar.”

Entre memórias e convocações, ela fez um chamado direto à ação coletiva: uma frase que atravessou o salão e permaneceu pairando no ar. “Vamos tomar esse país, vamos tomar esse mundo nas mãos, porque ele só muda se nós tomarmos essa decisão juntas.” 

O dia seguiu com trocas intensas, falas potentes e reencontros emocionados. Ao longo da manhã e do início da tarde, os Diálogos Globais por Reparação e Bem Viver mostraram que a Marcha das Mulheres Negras acontece em escala mundial porque as violências que atravessam as mulheres negras também são globais, mas a potência da organização e da imaginação política negras é igualmente internacional.

O encontro antecedeu a Marcha e ampliou o horizonte coletivo

Na segunda-feira (24), dentro da programação dos Diálogos Globais, foram feitos debates acerca do papel dos países caribenhos na luta pelo direito das mulheres negras. “Não é possível pensar Reparação e Bem Viver sem incluir o Caribe”, destacou Esther Giron, da República Dominicana e integrante do movimento coletivo Aquelarre. A oportunidade também serviu para promover a realização do Eflac 16 (Encontros Feministas Latino-Americanos e Caribenhos), que acontecerá no Haiti, em 2027. 

Com o tema “Cimarronas del Caribe: Resistencias feministas y antirracistas en la isla de Ayití rumbo al EFLAC 16”, o diálogo foi encabeçado por Nathalie Vilgrain, da Organização Feminista Marijãn, do Haiti; Johanna Agustin, do Mujeres Socio Politicas Mamá Tingo, República Dominicana; Maydi Estrada, professora Titular em Filosofia/Antropologia na Universidade de Havana, Cuba; e Esther Giron.

“Acreditamos que o Caribe e as práticas antirracistas da ilha podem ser um ponto de partida para o movimento negro global”, avaliou Johanna Agustin, em uma referência às lutas e movimentos históricos de resistência desde o período escravocrata na região. “Muitas vezes não somos representadas nos espaços globais, então estar aqui é ato de rebeldia e alegria também”, completou.

Percepção também partilhada por Nathalie Vilgrain. “Para nós é importante [falar] que temos muita coisa a oferecer à região [do Caribe] e ao mundo e essas são coisas que nos trouxeram hoje ao Brasil”, disse a jovem haitiana em referência ao contexto político revolucionário às vésperas da Marcha de Mulheres Negras por Reparação e Bem Viver, que aconteceu nesta terça-feira (25), em Brasília (DF)

Avançando contra políticas reacionárias

Após o diálogo inicial, a programação continuou com o painel “”Politicas Neoliberales  Discursos Conservadores anti-negritud, anti-trans, anti-antipluralidad”, com a presença de Mikaella Drullard, da República Dominicana; Jéssica Murillo e Paola Palácios, da Colômbia; e Esther Giron.

O objetivo foi realizar diálogos transfronteiriços e horizontais para refletir as articulações necessárias de movimentos negros, decoloniais num contexto em que a direita conservadora tem avançado sobre diversas dessas regiões.

Semana por Reparação e Bem Viver

Os diálogos globais, assim como muitos eventos que ocuparam e estão ocupando a capital federal desde a última quinta-feira (20) e seguirão até esta quarta-feira (26), fazem parte da programação oficial da Semana por Reparação e Bem Viver. As agendas são promovidas por coletivos e organizações de todos os cantos do país e também internacionais, mobilizadas em torno da Marcha das Mulheres Negras por Reparação e Bem Viver. Para conhecer toda a programação, acesse os perfis da Marcha nas redes sociais. 

A Marcha das Mulheres Negras por Reparação e Bem Viver é uma mobilização de caráter nacional e internacional, que acontece quase 10 anos depois de mais de 100 mil mulheres negras marcharem em 2015 contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver – um processo histórico que impactou e definiu os rumos da nossa organização política no Brasil e na América Latina.

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