Acusado pelo feminicídio de Elitânia de Souza vai a júri popular no dia 24 de julho, em Cachoeira (BA)

A jovem quilombola tinha 25 anos e estava prestes a se formar em Serviço Social na UFRB quando teve sua vida interrompida.

Da Redação

A jovem quilombola Elitânia de Souza da Hora estava prestes a se formar em Serviço Social na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), era ativista de direitos humanos e líder na Comunidade Quilombola do Tabuleiro da Vitória, em Cachoeira (BA), quando foi assassinada a tiros pelo seu ex-namorado, no dia 27 de novembro de 2019, aos 25 anos. 

Mais de quatro anos depois do crime, Alexandre Passos Silva Góes irá a júri popular, acusado de homicídio duplamente qualificado (feminicídio e por ter sido à traição, emboscada). O júri acontece no próximo dia 24 de julho, às 8h, no Fórum Augusto Teixeira de Freitas, em Cachoeira (BA). 

Antes do júri, haverá um ato público pacífico, às 7h, para apoiar a família e pedir justiça por Elitânia e por todas as mulheres vítimas de violência e feminicídio. 

Elitânia estava sob medida protetiva

Elitânia caminhava para casa acompanhada de uma amiga após ter aulas no campus da UFRB, em Cachoeira, quando foi surpreendida e morta a tiros por Alexandre, que não aceitava o fim do relacionamento. Ele já havia agredido a estudante e a ameaçava constantemente. A jovem já havia prestado queixa contra ele duas vezes, tinha uma medida protetiva expedida pela Justiça de São Félix (BA), município vizinho a Cachoeira, e aguardava a expedição de outra medida protetiva pela Justiça de Cachoeira, que não foi emitida há tempo. 

A medida protetiva é um mecanismo jurídico que se propõe a proteger vítimas da violência doméstica ou familiar, prevendo o afastamento do agressor da sua convivência e proibindo que se aproxime. No entanto, são muitas as fragilidades que impedem que esses instrumentos funcionem de forma efetiva, resultando em diversas histórias de mulheres que, assim como Elitânia, foram vítimas de feminicídio mesmo sob medida protetiva.

De acordo com a Anistia Internacional, 62% das vítimas de feminicídio no Brasil em 2022 eram mulheres negras. Já o último Atlas da Violência, publicado em junho de 2024, mostra que as mulheres negras representam 66,4% das mulheres vítimas de homicídio no Brasil em 2022. Segundo dados da Coordenação Nacional de Quilombos (CONAQ), o cenário é ainda mais preocupante entre as mulheres negras quilombolas: o feminicídio foi a segunda maior causa de assassinatos contra a população quilombola entre 2018 e 2022, totalizando 31,25% dos casos, atrás apenas das mortes por conflitos fundiários (40,62%). O Nordeste é a região com maior número de feminicídios de quilombolas.

Vida de ativismo e planos para sair da cidade em busca de segurança

Elitânia atuava no Coletivo de Estudantes Quilombolas da UFRB – Osório Brito e era secretária da Associação de Mulheres do Quilombo Tabuleiro da Vitória (AMQTVA). Ela orientava estudantes quilombolas desde a inscrição no ENEM, na matrícula na universidade e no processo para concorrer à bolsa permanência.

Izabelli Santos da Conceição, jovem quilombola e mestranda em Ciências Sociais que integrava o movimento de estudantes quilombolas da UFRB junto com Elitânia, contou em entrevista ao Instituto Odara que a amiga começou a faltar aulas e atividades do coletivo em meados de 2019. Em outubro daquele ano, quando participou de uma ocupação estudantil, Izabelli lembra de ouvir o desabafo da amiga sobre as ameaças de morte e agressões que já havia sofrido do ex-namorado.

A jovem planejava finalizar o semestre acadêmico, e então sair da cidade, para buscar um lugar onde pudesse escrever seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) em segurança. Mas sua vida foi interrompida abruptamente apenas um mês depois da conversa.

Em dezembro de 2019 – em razão do feminícidio de Elitânia – o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e a Organização das Nações Unidas (ONU) Mulheres emitiram uma nota conjunta pedindo o fim da violência contra as mulheres.Desde 2020, todos os anos acontece na UFRB e em comunidades de Cachoeira, a Semana Elitânia de Souza, com o objetivo de denunciar as violências que atingem as mulheres negras e cobrar respostas pelo assassinato da jovem quilombola. A agenda é organizada pelo Instituto Odara, em parceria com o Coletivo Angela Davis, a Tamo Juntas, o Centro de Artes Humanidades e Letras (CAHL – UFRB), professoras e estudantes do curso de Serviço Social da UFRB e organizações políticas locais como a Rede Elas Negras Conexões, a Articulação de Mulheres Negras no Quilombo Engenho da Ponte e o Núcleo de Mulheres do Rosarinho.

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