Com programação gratuita, III Semana do Audiovisual Negro segue até dia 12 de abril

Na última terça-feira (5), estreou no estado de Pernambuco a III Semana do Audiovisual Negro (SAN). O evento vai até o dia 12 deste mês, e está levando debates, ciclos de formação e exibição de filmes para Recife, Olinda e Afogados da Ingazeira.

Cineastas que compõe a programação falam da importância de curadorias que visam pessoas negras e indígenas, exibindo trabalhos que não fazem parte dos circuitos mais comerciais do Brasil

Por Andressa Franco

Imagem: Letícia Batista

Na última terça-feira (5), estreou no estado de Pernambuco a III Semana do Audiovisual Negro (SAN). O evento vai até o dia 12 deste mês, e está levando debates, ciclos de formação e exibição de filmes para Recife, Olinda e Afogados da Ingazeira. Com uma programação gratuita, e com alguns filmes acessíveis para pessoas com deficiências, a SAN pretende alcançar grupos sociais que têm acesso dificultado aos festivais audiovisuais que não fazem parte dos circuitos mais comerciais do Brasil.

Para o idealizador e coordenador do festival, o cineasta Rafael Nascimento, a iniciativa, que ocupa os principais cinemas da região, é uma oportunidade de democratizar o acesso aos filmes exibidos.

“Um evento gratuito possibilita que a população negra e indígena, que muitas vezes é excluída desses espaços, estejam presentes. E que a gente consiga mostrar nossos trabalhos, que não são aceitos em diversos festivais e cinemas”, declara Nascimento. Ele acredita que apesar de significativa, essa articulação ainda é insuficiente. “Os recursos que a gente acessa ainda não permitem que a gente faça tudo que gostaríamos”.

A primeira edição da SAN foi realizada apenas no cinema da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Já neste ano, as exibições de filmes, atividades de formação e debates acontecem nos cinemas da UFPE, São Luiz, Teatro do Parque, Museu da Abolição, Centro Cultural Bongar e Cine São José. Algo que, para Rafael, significa uma expansão importante do evento.

“O festival já cresceu por si só, a gente consegue ter um público que acessa tanto o Centro, quanto a Zona Oeste”, pontua o coordenador. Repetindo uma parceria com a Secretaria de Educação, as atividades da Semana vão atingir também estudantes de escolas públicas. Outro ponto positivo, cita, é o maior número de longas exibidos em comparação às edições anteriores. “As distribuidoras confiaram em disponibilizar os seus longas, o que normalmente tem um custo, então o festival já tem esse respeito no meio do audiovisual”.

“A necessidade de criar é maior do que a de mostrar”

A programação da III Semana do Audiovisual Negro conta com produções de realizadores do Norte, Nordeste e Sudeste do país entre curtas e longas-metragens. Além deles, o evento também conta com três oficinas e três debates sobre o mercado, crítica e performance que andam junto com o audiovisual negro e indígena.

Uma das produções a ser exibida, é “Fartura”, de Kulumym-Açu, originário do Mangue do Rio Ceará-Mirim em Fortaleza (CE), e que ocupa multiplicas linguagens artísticas, entre elas o cinema. O jovem de 27 anos que, com a pandemia de covid-19, voltou a morar com os pais em Sobral, município no interior do Ceará, se inspirou na experiência para desenvolver sete vídeo artes, sendo “Fartura” a quarta delas.

Kulumym-Açu / Imagem: Acervo Pessoal

“Minha participação na SAN é feita a partir de um filme que fala como é viver o tempo colapsado e para além desse colapsado, que foi a incidência da pandemia da covid-19”, explica. Iniciativas como a da SAN são, do ponto de vista de Kulumym, vitais. E o acesso gratuito, principalmente para estudantes de escolas públicas, têm potencial para gerar debates e conhecimento sobre a prática do audiovisual como uma cultura popular.

“Propostas como a SAN, com curadorias que visem pessoas negras e indígenas nesses contextos de contar histórias que são negligenciadas por cinemas de estruturas, é muito vital. Percebo que as condições de realização não são as mesmas aqui e lá [no Sudeste]”, avalia.

O cineasta, no entanto, acredita que, a necessidade de criar, faz com que as populações criem, independentemente de ter ou não um festival para mostrar seus trabalhos. “Eu penso que essas realizações audiovisuais vão continuar independentemente de ter plataformas de exibição, porque a necessidade de criar é maior do que a de mostrar”.

Descentralizando o audiovisual

Dados de uma pesquisa realizada em 2017 pelo portal G1 com base nos números mais atualizados do Observatório do Cinema e do Audiovisual, vinculado à Ancine, e nas estimativas populacionais do IBGE, revela mais uma das desigualdades entre as regiões do Brasil, o acesso ao cinema. Os números mostram que o Sudeste tem a maior oferta de cinema: 54,7% das salas estão na região, ou seja, há uma sala de cinema para 49.975 pessoas. Por outro lado, o Nordeste concentra 15,5% das salas de cinema do país, o que significa uma sala de cinema para 116.155 pessoas.

Com uma programação gratuita, dividida em três cidades na região metropolitana e no sertão do Pajeú, a SAN tem a intenção de reafirmar seu objetivo de disputa de narrativas e territórios. Além de estar articulado com organizações de movimentos sociais e negros da cidade na mobilização para o evento.

“Quando a gente fala de problemas raciais, isso é muito pautado na ideia sul-sudeste, e parece que as narrativas são apenas essas. Acredito que projetos como esse fazem com que a gente tenha uma reflexão ampla do que é ser uma pessoa preta no Brasil”, defende Joe Andrade, atriz, dramaturga, roteirista e diretora.

Joe Andrade – Imagem: Acervo Pessoal

A cineasta assina o roteiro de “É quase impossível não me amar”, filme que traz uma reflexão sobre afetividade. Tem direção de Gabriela Braga e está presente na programação da SAN, experiência que Andrade define como fantástica.

“É um evento muito importante, principalmente aqui no Recife, que tem um histórico de racismo grande. O cinema recifense ainda é muito pautado na branquitude, esse evento contribui para ressignificar o audiovisual”, destaca Joe.

Assim como Kulumym, Joe também vê com grande impacto a presença de estudantes de escolas públicas no evento, sendo esta uma oportunidade para dialogar com as temáticas propostas nos próprios filmes exibidos.

“As pessoas oriundas de escola pública são majoritariamente negras, que por muito tempo não têm referências. Isso porque às vezes as referências que a gente tem são muito inalcançáveis, distantes da nossa realidade”, complementa.

O encerramento da III Semana do Audiovisual Negro ocorre no Escama, baile de rap e brega recifense que acontece no dia 09 às 22h no Kilombo Urbano, no bairro da Boa Vista. A Semana do Audiovisual Negro tem apoio e parceria do Cineclube Alma no Olho, Tarrafa Produtora, Maat Produções, Pajeú Filmes, Coletivo Negritude do Audiovisual PE e APAN (Associação dos Profissionais do AudiovisualNegro). O evento teve a primeira edição em 2019 na inauguração do Cine UFPE e a segunda em 2021 de forma online. Este ano a Semana acontece com incentivo do Funcultura Audiovisual.

Confira o restante da programação

09/04/2022

10h – Oficina: Filme-Carta – Centro Cultural Bongar

15h30 – exibição de curtas  – Cinema São Luiz

16h00 – CineBongar – Centro Cultural Bongar

17h30 – SESSÃO ESPECIAL NEGRITUDE NO AUDIOVISUAL PE – Cinema São Luiz

19h30 – Exibição do filme Cabeça de Nêgo(CE) – Cinema São Luiz

11/04/ 2022

exibições de curtas e rodas de diálogo em escolas da Rede Pública de Ensino de Afogados da Ingazeira

12/04/2022

19h30 – exibição de curtas – Cine São José

20h30 – O Bem Virá (2020)- Cine São José

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