Por Catiane Pereira
O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e a Polícia Civil investigam a atuação da conselheira tutelar Cláudia Damiana da Silva Teixeira, acusada de coagir e revitimizar uma adolescente de 17 anos durante um atendimento em setembro de 2024, na UPA do Sol Nascente, em Ceilândia (DF). A jovem havia relatado abusos psicológicos e sexuais cometidos pelo próprio pai.
De acordo com a vítima, a conselheira fez comentários discriminatórios, associando sua orientação sexual e sua descrença religiosa ao “demônio”, além de repreendê-la com frases como “você precisa ler a Bíblia” e “o que você está me dizendo é pecado”. A adolescente relatou ainda que foi coagida a escolher entre mudar de cidade, sem contato com familiares e sem celular, ou permanecer com a mãe.
O atendimento terminou com a conselheira exibindo à jovem imagens de automutilação. Pouco depois, a adolescente tentou tirar a própria vida. A Justiça aplicou uma medida protetiva de urgência contra Cláudia Damiana, que está proibida de se aproximar ou manter contato com a vítima, sob pena de prisão.
O caso é apurado em três frentes:
- Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT): instaurou inquérito civil para avaliar violações éticas e legais na conduta da conselheira;
- Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF): a Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam II), em Ceilândia, conduz investigação criminal;
- Comissão de Ética e Disciplina dos Conselheiros Tutelares (Cedicon): abriu processo administrativo em fevereiro de 2025, após denúncia anônima.
A deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP) pediu ao MPDFT a prisão da conselheira. No pedido formal, a parlamentar sustenta que Cláudia deve ser responsabilizada criminalmente por homotransfobia e indução ao suicídio, com decretação de prisão preventiva e destituição do cargo, para evitar novos casos de violência institucional.
Até o momento, não há informações oficiais se a investigada continua exercendo a função no Conselho Tutelar do Sol Nascente.
O episódio evidencia um problema já apontado por especialistas e movimentos sociais sobre a atuação dos Conselhos Tutelares. Reportagem publicada pela Afirmativa em 2023 mostrou como setores conservadores, especialmente ligados a igrejas neopentecostais, têm ocupado grande parte das cadeiras nos conselhos pelo país, muitas vezes subordinando o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) a valores religiosos. Na ocasião, especialistas alertaram para os riscos de violações de direitos de crianças e adolescentes, sobretudo da população negra e LGBTQIA+.
É nesse contexto que as denúncias de abuso e exploração sexual contra crianças e adolescentes dispararam no país. Dados do Ministério dos Direitos Humanos apontam crescimento de 195% nos registros recebidos pelo Disque 100, que passaram de 6,3 mil em 2020 para 18,8 mil em 2024. Segundo o Atlas da Violência 2025, 13 crianças e adolescentes são vítimas de violência a cada hora no Brasil, somando mais de 115 mil casos anuais.