Jovem indígena morre após parto forçado em Marabá (PA), e família denuncia negligência médica

Yapê Rê Anambé Guajajara, de 17 anos, foi submetida à indução do parto, que durou cerca de 14 horas, no Hospital Materno Infantil de Marabá. O caso acende alerta sobre a violência obstétrica sofrida por mulheres indígenas no estado.
Imagem: Tay Marquioro / O Liberal

Por Patrícia Rosa

Uma jovem indigena de 17 anos morreu após passar por um parto induzido, que durou cerca de 14 horas, em Marabá (PA). Yapê Rê Anambé Guajajara, moradora de Itupiranga, cidade vizinha, deu entrada no Hospital Materno Infantil de Marabá (HMI) no dia 16 de junho, grávida de 41 semanas. O bebê nasceu no dia seguinte, mas a jovem morreu cinco dias após o parto.

A família denuncia violência obstétrica e demora no atendimento da vítima. Ainda no dia 17, Yapê foi transferida em estado gravíssimo para o Hospital Regional Público do Sudeste do Pará. Ela apresentava quadro de hemorragia intensa e sofreu duas paradas cardiorrespiratórias. De acordo com a Polícia Civil, a jovem chegou entubada à unidade e faleceu cinco dias depois, no dia 22 de junho. A criança sobreviveu e está sob os cuidados da família.

Denúncia de negligência e parto forçado

De acordo com apuração do jornal Brasil de Fato, a mãe da adolescente, Luciane Nascimento Anambé, relatou à Promotoria de Justiça de Marabá que o parto foi “brutal” e “tiraram a criança à força”. No doloroso relato, Luciane descreveu que sua filha estava coberta de sangue e que viu os médicos com as mãos dentro da paciente, puxando e “tirando coisas de dentro dela”. Ela ainda declarou que o profissional levou um tempo excessivo para finalizar a sutura.

A mãe também contou que, momentos antes do parto, presenciou uma discussão entre dois médicos sobre qual seria a melhor via de nascimento. “Se tivessem feito a cesariana, como o outro médico queria, nada disso teria acontecido”, lamenta.

Família denuncia recusa do IML em realizar autópsia

A dor da perda foi agravada por uma nova violência. A família de Yapê denunciou que o Instituto Médico Legal (IML) recusou-se a realizar a autópsia interna, procedimento essencial para a apuração da causa da morte. A tia da jovem, Regilane Guajajara, explicou em um vídeo publicado em sua rede social, que o corpo da vítima foi devolvido para o hospital regional.

É uma indígena, menor de idade, que sofreu violência obstétrica. A gente tem o direito de saber a causa da morte. Já chega de omissão do Estado e do município com as mulheres que vêm pra Marabá.”

Autoridades se manifestam

Em nota, a prefeitura de Marabá se solidarizou com os familiares da vítima, e afirmou que a jovem deu entrada no hospital materno com um leve quadro de hipertensão arterial e fora do trabalho do parto. 

“Após constatadas condições favoráveis, a indução do trabalho de parto foi iniciada às 19h30 do mesmo dia. Na iminência do nascimento do feto, às 9h42 do dia 17 de junho, após o trabalho de parto ter sido realizado sem intercorrências, a paciente evoluiu com episódio de eclâmpsia. A assistência ao parto foi prestada com cuidados obstétricos necessários à emergência”, completou a nota. 

A Polícia Civil declarou também por meio de nota que perícias foram solicitadas e testemunhas estão sendo ouvidas.

Através de suas redes sociais, a deputada estadual Lívia Duarte (PSOL/PA) informou ter enviado ofícios ao Ministério Público do Estado do Pará, às Secretarias Estadual e Municipal de Saúde (Sespa) e ao Conselho Estadual de Direitos Humanos do Pará (CEDH/PA), cobrando providências.

“Não podemos naturalizar a morte de parturientes. Pobres e indígenas não são menos gente que ninguém. Esse hospital tem uma incidência de mortes de mães e de bebês que chama a atenção. Não é a primeira vez que venho denunciar e cobrar providências quanto ao Hospital Materno Infantil de Marabá.”

A morte de Yapê não é um caso isolado

A morte de Yapê não é um episódio isolado. Em outubro de 2023, Tereza Nunes de Castro, de 23 anos, também morreu após complicações obstétricas no mesmo hospital. Durante o parto, seu bebê teve o braço fraturado e, segundo a família, Tereza teve o intestino perfurado na cesariana. Após duas reinternações, faleceu em 27 de janeiro de 2024, no Hospital Regional.

Em março de 2024, a Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor da Assembleia Legislativa do Pará (Alepa) realizou uma audiência pública em Marabá. Na sessão, foram registrados cerca de 15 relatos de violência obstétrica e neonatal ocorridos no HMI entre os anos de 2019 e 2024.

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