Por Elizabeth Souza
93 anos. Esse é o tempo de existência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no Brasil. E nessas mais de nove décadas, nunca teve uma mulher negra ocupando o cargo efetivo de ministra. Liderando um governo que se diz comprometido com a democracia e a diversidade, o presidente Lula da Silva teve a oportunidade de pôr fim a esse hiato que imprime as facetas do racismo e do machismo no país. E, mais uma vez, foi negligente.
Novamente, diversos brasileiros e brasileiras vibraram de esperança ao acreditar na nomeação da advogada baiana Vera Lúcia Santana Araújo, como a primeira ministra negra titular do TSE. Mas a rasteira veio, e Lula optou por nomear a advogada Estela Aranha e o advogado Floriano de Azevedo Marques, engrossando o caldo da branquitude apadrinhada que ocupa o Judiciário brasileiro, que tem 80% de seus cargos ocupados por pessoas brancas. Os números são do Diagnóstico Étnico-Racial do Poder Judiciário, realizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Um dejavú. Em 2023, Lula também abriu mão de escolher a primeira mulher negra para o cargo de ministra no Supremo Tribunal Federal (STF), com seus mais de 133 anos de história. Mesmo em meio a um forte apelo social de civis, movimentos, coletivos e de juristas do próprio STF, Lula se mostrou irredutível e não se deixou abalar pelas críticas e decepções.
“Isso em um contexto de ameaça real à participação de mulheres negras na política institucional. Já que o Novo Código Eleitoral, em tramitação, traz retrocessos como o fim da obrigatoriedade de 30% de mulheres nas chapas dos partidos e ignora as resoluções do TSE sobre distribuição proporcional de recursos para candidaturas negras”, diz nota pública divulgada por movimentos que apoiaram e fizeram campanha pelo nome de Vera Lúcia para o TSE. A nota é assinada por Mulheres Negras Decidem, Coalizão Negra por Direitos, Juristas Negras e Nossas.
O TSE é composto por sete ministros titulares, sendo três oriundos do Supremo Tribunal Federal (STF), dois do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) – esses são escolhidos pelos próprios Tribunais em que atuam – e dois juristas (advogados/as), escolhidos pelo presidente da República através de duas listas tríplice feita pelo plenário do TSE. Nesse sentido, é feita a indicação de seis nomes. O de Vera Lúcia se destacava em uma das listas formulada pela própria presidente do TSE, a ministra Cármen Lúcia, que apresentou três nomes de advogadas a Lula com o objetivo de incentivar a escolha por uma mulher ao cargo.
Com “notável saber jurídico e reputação ilibada” – qualidades previstas pela Constituição Federal de 1988 aos ministros e ministras nomeados para o TSE – e com mais de 30 anos de militância na advocacia, Vera Lúcia atua como ministra substituta da Corte Eleitoral desde 2024, sendo a segunda mulher negra a ocupar tal cargo. A primeira é a advogada Edilene Lôbo, desde 2023.
Portanto, qualificação é o que não falta à Vera Lúcia. Por outro lado, falta a Lula o compromisso real com a diversidade e com o combate às desigualdades de raça e gênero nos espaços de poder e decisão desse país.
Em um território nacional, como o nosso, composto por uma população de maioria negra, tendo as mulheres negras como maior grupo demográfico, o governo, em meio a embates internacionais, insiste em dizer que o “Brasil é dos brasileiros”, mas parece esquecer quem de fato é esse Brasil.