Por Karla Souza
Quatro pesquisadoras que denunciaram assédio moral e sexual por parte do sociólogo Boaventura de Sousa Santos estão sendo processadas pelo acadêmico em Portugal. A ação judicial, que corre no Juízo Local Cível de Coimbra, pede retratação pública e reconhecimento de sua excelência como professor, além de estabelecer multas para as denunciantes caso não cumpram a ordem judicial.
O processo ocorre quase dois anos após a publicação de uma carta anônima que deu início às denúncias contra Boaventura. Sara Araújo, Carla Paiva, Maria Teresa Martins e Gabriela Freitas Figueiredo Rocha, integrantes do coletivo de vítimas, saíram do anonimato em 2024 e agora enfrentam o processo. Elas acusam Boaventura de práticas como assédio moral e sexual, abuso de poder e extrativismo intelectual, além de monitoramento de suas atividades online.
Em resposta à ação, o coletivo lançou a página Academia Sem Assédio para divulgar o caso e arrecadar fundos para custos legais. Sara Araújo, uma das processadas, afirma que a iniciativa de Boaventura representa uma tentativa de silenciamento. “As únicas pessoas sob julgamento somos nós, as vítimas”, declarou em uma publicação nas redes sociais.
O caso também reacende discussões sobre o papel das instituições acadêmicas. O Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra, onde Boaventura atuava, encerrou um inquérito interno sem divulgar os resultados, mas pediu desculpas públicas às vítimas. Em novembro de 2023, o sociólogo se demitiu do CES, alegando que o processo foi conduzido de forma parcial e sem direito de defesa.
À Agência Pública, a advogada Lara Roque Figueiredo, que representa as pesquisadoras, destacou o caráter intimidatório da ação judicial. Segundo ela, obrigar vítimas a desmentirem suas experiências é uma estratégia para constranger e inibir futuras denúncias. Outras seis audiências estão previstas para janeiro, e as rés aguardam por esclarecimentos sobre o encerramento do inquérito interno conduzido pelo CES.
As primeiras acusações contra Boaventura surgiram em março de 2023, em um capítulo de livro que protegia as identidades das denunciantes e não citava o nome do sociólogo. Contudo, ele se identificou como o referido “professor-estrela”. Denúncias posteriores, como a da deputada federal Bella Gonçalves (PSOL-MG), ampliaram a repercussão das acusações.
Enquanto o Ministério Público de Portugal conduz uma investigação sob sigilo judicial, as vítimas seguem mobilizadas. Para as pesquisadoras, o caso reflete as dificuldades enfrentadas por mulheres no meio acadêmico ao denunciarem figuras de prestígio.
*Com informações da Agência Pública