Território do líder indígena Xokleng assassinado em Santa Catarina era região de conflito por demarcação

Ariel Paliano, de 26 anos, foi encontrado morto, com ferimentos na cabeça e o corpo parcialmente queimado, a 300 metros da casa em que vivia com a mãe e o padrasto.

Da Redação

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) se manifestou no último sábado (27) a respeito do assassinato do jovem líder indígena Xokleng, Ariel Paliano, de 26 anos. Ele foi encontrado morto na noite da última sexta-feira (26) às margens da estrada entre Itaiópolis, município no Norte de Santa Catarina, e José Boiteux, no Vale do Itajaí. O corpo estava a 300 metros de distância da casa em que o jovem morava em uma comunidade que faz parte do território Laklãnõ/Xokleng.

De acordo com relatos da comunidade, o líder indígena teria sido vítima de uma emboscada, quando saiu de casa para comprar alimentos numa mercearia. Ele estava sozinho porque a mãe e o padrasto participavam do Acampamento Terra Livre (ALT), em Brasília.

Ariel era vice-cacique da Aldeia Kakupli, interior da Terra Indígena (TI) Ibirama La Klãnô, do povo Xokleng. De acordo com o Cimi, a região está em conflito por demarcação, e já havia sido atacada a tiros em março e abril deste ano. O jovem foi encontrado com ferimentos na cabeça e o corpo parcialmente queimado.

“Trata-se de uma região de conflito pela demarcação da terra indígena. Nos últimos meses, a aprovação e promulgação da Lei 14701/2023, que torna vigente o marco temporal, e a decisão tomada pelo ministro Gilmar Mendes no dia 22 de abril, que manteve a vigência da Lei 14701/2023, foram entendidas como uma vitória dos setores que se contrapõem à demarcação da TI Ibirama La Klãnô, repercutindo no endurecimento do ambiente de tensão que se vive na região”, disse o Conselho em nota.

Marco temporal gera insegurança nos territórios

Foi justamente a disputa pela TI Ibirama Klãnô, citada pela entidade, a utilizada para reconhecer como inconstitucional a tese do marco temporal ao ser analisada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Seguir o chamado marco temporal significa que os indígenas só podem reivindicar a demarcação de terras nas quais já estivessem estabelecidos antes da data de promulgação da Constituição de 1988.

Apesar de derrubada pelo STF em setembro, a tese foi aprovada pelo Congresso no mês seguinte, ainda que o presidente Lula tenha vetado parcialmente a lei aprovada, o Congresso reagiu de imediato derrubando os vetos, e garantindo assim a vigência da norma. A situação tem gerado insegurança jurídica, física, existencial e simbólica em diversos territórios. 

Na nota, a entidade reforça seu alerta às autoridades sobre as consequências “desastrosas” provenientes da aprovação e vigência da Lei 14701/2023. O Conselho exigiu ainda imediata apuração do crime, identificando e punindo os responsáveis.

O cenário de crise e preocupação foi reforçado também em uma nota conjunta da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e da Juventude Indígena Xokleng (Ajix). “O caso ocorre em meio a conflitos entre a comunidade Xokleng e fazendeiros locais, que têm ameaçado as terras Xokleng”, diz a publicação. As organizações afirmaram ainda que a família do jovem recebeu ameaças recentemente, inclusive com disparos de tiros que não atingiram ninguém, mas deixaram a comunidade em estado de alerta.

A Apib também chamou atenção para a urgência da demarcação nas terras indígenas. “A trágica morte de Ariel destaca a urgência de abordar as questões de demarcação, segurança e direitos das comunidades indígenas, não só em Santa Catarina, mas em todo o país. Este evento é mais um lembrete sombrio das ameaças persistentes enfrentadas pelos povos indígena.”

Investigação

A Polícia Federal abriu inquérito para investigar o caso. O Ministério Público Federal informou que solicitaria à Polícia Militar auxílio na segurança do local. Já a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), afirmou em nota ao Valor Econômico, que acompanha o caso e está em constante contato com a comunidade e com as autoridades locais.

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