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Universidade Federal do Rio Grande recorre de decisão judicial que ameaça a política de cotas para estudantes trans na instituição

A decisão anula a política de cotas para pessoas trans e determina o cancelamento das matrículas de estudantes já ingressos até o fim do ano letivo
Imagem: Afirmativa

Por Patrícia Rosa

A Universidade Federal do Rio Grande (FURG) decidiu recorrer da decisão do juiz Gessiel Pinheiro de Paiva, da 2ª Vara Federal do Rio Grande do Sul, que anulou a política de cotas voltada a pessoas trans na instituição. A sentença foi proferida no último dia 25 de julho.

Segundo a decisão, até o fim do ano letivo, os alunos que ingressaram na universidade através da política entre os anos de 2023 e 2025 terão suas matrículas canceladas, podendo apenas concluir as matérias em andamento. A medida atinge cerca de 30 estudantes.

O posicionamento do magistrado foi uma resposta a uma ação pública ajuizada por dois advogados, Bruno Cozza Saraiva e Djalma Silveira da Silva, que questionaram a legalidade da resolução CONSUN/FURG nº 11/2022, que trata de alterações no Programa de Ações Afirmativas da universidade. Eles argumentaram que a FURG não teria competência legal para criar novas modalidades de cotas. A Instituição instituiu a reserva de vagas específicas para pessoas trans em 7 de outubro de 2022.

Na sentença, o argumento utilizado é de que a justificativa baseada no número de assassinatos de pessoas trans no Brasil seria inadequada. “Os supostos números alarmantes citados pelo proponente como violência de gênero não parecem ser em nada discrepantes dos números da violência em geral no Brasil.”

O texto ainda afirma que, para a adoção de uma ação afirmativa, deve haver uma correlação clara e direta entre a medida criada e o problema específico enfrentado pela população beneficiada.

“Questões como falta de acesso a políticas públicas de saúde, evasão escolar nos ensinos fundamental e básico, violência doméstica e outros tipos de violência de gênero, etc., embora alarmantes, graves e que devem ser objeto de atenção pelo Estado, não possuem correlação lógica com o acesso à universidade, e não podem servir de motivação para a criação de políticas afirmativas nesse sentido”, declara o documento.

A FURG informou, por meio de nota, que reafirma o seu compromisso com a autonomia universitária, com os direitos humanos e com a proteção da sua comunidade acadêmica. A universidade se colocou à disposição do corpo universitário, em especial daqueles impactados pela referida sentença, tanto para acolhimento quanto para a garantia dos seus direitos acadêmicos.

Pessoas trans representam apenas 0,3% dos estudantes nas universidades federais

A transfobia impõe barreiras e violência profundas à população trans. De acordo com dados do Transgender Europe (TGEU), o Brasil lidera, pelo 17º ano consecutivo, o ranking dos países que mais matam pessoas trans no mundo, entre aqueles que monitoram esses dados. Além disso, é um país com baixo acesso de pessoas trans ao ensino superior: segundo a V Pesquisa Nacional de Perfil Socioeconômico e Cultural dos Estudantes de Graduação nas Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes/GEMAA, 2018), pessoas trans representam apenas 0,3% dos estudantes nas universidades federais.

A ativista da FONATRANS e presidenta da ONG Casa de Malhú, Bruna Ravena, considera a decisão um retrocesso para o avanço da qualificação e das lutas da comunidade trans e travesti por igualdade salarial, acesso a direitos básicos e justiça social.

“Isso vai contra a vida de pessoas trans, contra o avanço da população trans na área acadêmica, na formação de pensadores de opinião, na busca por qualidade de vida, empregabilidade, por uma posição melhor na sociedade. Que eles revoguem, porque as cotas são importantes para o acesso dessas pessoas.”

Bruna Ravena é ativista da FONATRANS e presidenta da ONG Casa de Malhú

A FURG não é a primeira universidade brasileira a adotar o sistema de cotas específicas para pessoas trans e travestis. Mais de 10 universidades federais e estaduais no Brasil já implementaram essa política afirmativa.

O Grupo de Pesquisa Direito e Sexualidades – GDiS, da FURG, manifestou sua indignação com a decisão. Para o grupo, ela fere o princípio da autonomia universitária, consagrado na Constituição Federal de 1988.

“A inclusão da população trans na Política de Ações Afirmativas da FURG, além de reparatória às iniquidades, desigualdades e violências sofridas, está amparada nos direitos humanos e fundamentais consagrados pelo Brasil. Assim, o GDiS reafirma seu compromisso na luta por uma universidade socialmente referenciada, plural e na defesa intransigente da política pública que garanta o acesso de pessoas trans à FURG por meio de seu processo seletivo específico.”

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