Policial militar acusado de matar a menina Geovanna Nogueira da Paixão, de 11 anos, é absolvido por júri popular

Geovanna foi morta na porta de casa, no bairro Jardim Santo Inácio, em Salvador (BA), em 2018.

Geovanna foi morta na porta de casa, no bairro Jardim Santo Inácio, em Salvador (BA), em 2018.

Por Andressa Franco

O ex-policial militar da 48ª CIPM Nildson Jorge Sousa França foi absolvido por júri popular nesta segunda-feira (21). Ele é acusado de matar a menina Geovanna Nogueira da Paixão, de 11 anos, em 2018.

O julgamento aconteceu no Fórum Ruy Barbosa, em Salvador (BA), cinco anos depois da morte de Geovanna, que aconteceu no dia 24 de janeiro de 2018. A menina estava abrindo o portão de sua casa para receber o avô, quando foi vítima de um tiro na cabeça, no momento em que os agentes realizavam uma ação no bairro Jardim Santo Inácio.

“Foi tudo muito rápido. Era por volta das 7h, eu estava saindo para trabalhar. Meu pai saiu de férias nesse dia e foi lá ver as crianças. Ela colocou o rosto na porta, fez aquela festa ‘eba é meu avô’. Foi quando ouvi os tiros. Quando olhei, ela estava no chão ensanguentada”, relata Maria Ângela de Jesus, mãe de Geovanna. A menina foi socorrida, mas não resistiu. “Eu não conseguia encarar eles [os policiais] de jeito nenhum porque eu imaginei que como já tinham feito com ela, fariam com todo mundo.”

O laudo pericial realizado apontou que a bala que matou a menina foi disparada da arma de Nildson. No julgamento, foram ouvidas duas testemunhas da acusação, e a defesa fez a leitura do depoimento de outro policial militar sobre os 10 anos da trajetória de Nildson na polícia. Hoje, ele trabalha como técnico no Tribunal Regional do Trabalho.

Acusado de homicídio doloso, quando há intenção de matar, o principal argumento da defesa foi o de que houve uma troca de tiros, e que a perícia não foi feita da forma devida pela Polícia Civil. O laudo policial, portanto, não teria sido determinante para saber de onde partiu o disparo que matou Geovanna.

Em entrevista ao telejornal Bahia Meio Dia, a advogada assistente de acusação Daiane Ribeiro declarou o entendimento de que “a partir do momento que uma pessoa com qualificação atira em uma área com bastante moradores, ele assume o risco de produzir aquele resultado. Como de fato produziu a morte de uma criança de 11 anos”. Lorena Pacheco também é advogada assistente da acusação, e informou ao telejornal que ainda não havia decisão sobre se a acusação iria recorrer.

Não é um caso isolado

Ângela se apresenta como mãe de uma vítima do Estado, e é acompanhada pelo projeto Minha Mãe Não Dorme Enquanto Eu Não Chegar, do Instituto Odara, que acompanha outras dezenas de casos de crianças e adolescentes negros vitimados pela ação da polícia em Salvador. Ela aguardava esperançosa por justiça.

“Só depois do Odara começamos a caminhar, porque antes estava tudo parado, eu não tinha notícias. Recentemente tivemos até um encontro de mães. Lá eu pude chorar porque meu filho não estava presente. Em casa eu não posso fazer isso”, desabafa Ângela, que é mãe de um menino, que na época do crime tinha apenas cinco anos e viu tudo acontecer. Ângela também é mãe de uma menina de três anos.

Maria Ângela, mãe de Geovanna Nogueira – Imagem: Ana Albuquerque

Na família, a memória que fica é de uma menina atenciosa com todos. “Todos os dias de manhã e de noite Geovanna ligava para o tio, para a tia, para mim, perguntava se já tinha saído para o trabalho, voltado da igreja, dado o banho do primo. Essa preocupação que todo mundo sente falta”, lamenta Ângela.

O luto de Ângela, infelizmente, é acompanhado por dezenas de mães em todo o país, se tornando um índice cada vez mais naturalizado, e uma das consequências mais violentas da chamada “guerra às drogas”. Os dados do último Anuário Brasileiro de Segurança Pública mostram que 76% dos mortos em decorrência de intervenção policial no Brasil têm entre 11 e 29 anos, em sua maioria negros. E o número de crianças têm crescido.

A região metropolitana do Rio de Janeiro, por exemplo, registrou ao menos 601 crianças e adolescentes baleados nos últimos sete anos, segundo dados do Instituto Fogo Cruzado divulgados no último dia 11 de agosto. Desse total, 286 foram atingidos em ações policiais — o que equivale a 47,5%.

Na Bahia, Geovanna integra uma longa e triste lista de crianças assassinadas em operações da Polícia Militar, junto a Joel Castro, Mirella Barreto, Geovanna Nogueira, Micael Menezes, Ryan Andrew, Gabriel Silva.

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