Raimundo Nonato foi morto a tiros na madrugada da última terça-feira (13) por grupo encapuzado enquanto dormia com a namorada em Araguatins (TO)
Por Andressa Franco
O Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos, rede composta por 45 organizações e movimentos sociais, manifestou na tarde desta quinta-feira (15) uma nota de pesar a respeito da morte de Raimundo Nonato Silva Oliveira, de 46 anos, liderança do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST). Conhecido como Cacheado, ele foi assassinado a tiros enquanto dormia com a namorada, em uma casa em Araguatins (TO), na madrugada desta terça-feira (13).
O corpo de Cacheado foi enterrado por volta das 17h desta quinta (15) em Araguatins, no cemitério municipal. O velório aconteceu em sua casa, na Vila Cidinha durante todo o dia. O comitê manifestou “indignação diante de mais um assassinato de mais um defensor de direitos humanos e ativista no Brasil”.
“Para o CBDDH, quando um militante de direitos humanos como “Cacheado” é assassinado, não é possível afirmar que vivemos um sistema democrático que não corre risco. Especialmente, quando há conflitos de territórios que privam sujeitos políticos da liberdade de ir e vir, e viver.”, diz a nota, que cobra investigação e punição aos responsáveis.
O crime
Raimundo Nonato foi morto a tiros na madrugada da última terça-feira (13) por grupo encapuzado enquanto dormia com a namorada em Araguatins. O crime, segundo relatou a namorada da vítima para a Polícia Militar, aconteceu por volta de 1h da madrugada, quando três homens encapuzados arrombaram a porta da frente da casa onde estavam dormindo, entraram no quarto e fizeram vários disparos de arma de fogo. Raimundo morreu no local.
A Polícia Militar informou que fez buscas à procura dos suspeitos, mas não encontraram ninguém. Em nota para o portal G1, a Secretaria de Segurança Pública do Tocantins disse que a equipe da 11ª Delegacia de Polícia de Araguatins está investigando o caso e se encontra na fase de levantamento das informações. O MST divulgou uma nota lamentando a morte do trabalhador, e exigindo justiça para que os responsáveis sejam identificados, detidos e julgados, evitando mais assassinatos no campo.
Natural de Barra da Corda (MA), “Cacheado deixa filhos e netos além de um legado de resistência, persistência e coragem, com uma continua preocupação com as bases e com ‘Trabalho de Base Dentro da nas Base’, algo que sempre deve ser lembrado e praticado”, escreveu a organização.
Sua militância em defesa da habitação popular começou quando perdeu o pai, também assassinado por pistoleiros. Segundo a Pastoral da Terra, o líder do acampamento sem terra Alto da Paz em Araguatins já tinha sofrido um atentado há 12 anos devido a conflitos agrários. Na época, ele foi baleado quando liderava o acampamento Alto da Paz, na fazenda Santa Hilário. A Defensoria Pública informou que as ameaças à vida de Raimundo ocorreram entre os anos de 2000 e 2015.
Assassinato pode ter ligação com milícias rurais no Tocantins
Segundo apurou reportagem da Brasil de Fato, movimentos ligados à luta pela terra em Tocantins suspeitam que o assassinato tenha participação de uma milícia rural paga por grileiros de terras. “Cacheado ficou muito visado pelo latifúndio, pelo poder judiciário e pela polícia. Ele se tornou uma pessoa muito vigiada e monitorada pelo poder político local do município de Araguatins e toda a região”, afirmou o dirigente do MST no Tocantins, Antônio Marcos, para a matéria.
Ainda de acordo com a reportagem, um dia antes do crime, homens desconhecidos foram até o acampamento Carlos Marighella e perguntaram por Cacheado. Na mesma data, o local recebeu a visita de policiais e de um oficial de justiça. O acampamento foi alvo de um interdito proibitório, medida judicial que impede a permanência dos assentados. O MST relatou também que a campanha dos latifundiários pela reeleição de Jair Bolsonaro (PL) no pleito deste ano despertou uma nova investida dos fazendeiros contra os sem terra.
Brasil é o país que mais mata ativistas pela terra
O último relatório da organização britânica Global Witness, que monitora crimes contra defensores de direitos humanos, especialmente ativistas pelo direito à terra e pela defesa ambiental, contabilizou o número de vítimas globais em 2021. Com um total de 200 mortes, sendo 68% somente na América Latina, o relatório aponta para a necessidade de criar mecanismos de defesa para aqueles que lutam pela terra e pelo meio ambiente.
De acordo com o documento, os conflitos envolvendo o uso e o controle de terras são uma questão central na maioria dos países onde as ameaças contra os defensores das questões ambientais estão presentes. Só no Brasil foram 342 ataques letais, tornando o país o lugar que mais mata ativistas pela terra. Entre as vítimas, uma a cada três foi de indígenas ou negros.