Home-Office e ensino EAD nas favelas

Por Selva*

 Durante a quarentena o trabalho através dos meios digitais se tornaram uma alternativa forte para não deixar que algumas empresas parem totalmente enquanto estão de portas fechadas, assim como em faculdades públicas e particulares, as aulas presenciais foram substituídas por plataformas digitais que funcionam no horário de aula a partir de uma vídeo chamada feita pelo professor. O que eu questiono aqui e penso que seja uma preocupação para muitas famílias é: se para trabalhar e estudar enquanto estivermos de quarentena é preciso estar conectado às plataformas digitais, como é que pessoas que não tem acesso a internet, não possuem aparelhos que comportam essas plataformas, vão acompanhar o ritmo de um Brasil que supostamente não pode parar?

Estar em casa para uns é sinônimo de descanso em tempo integral, colocar os filmes e séries em dia, estudar, dar atenção para o seu próprio autoconhecimento, cuidar da casa e de si. Mas essa não é a realidade nas periferias, porque para começo de conversa, grande parte dessas pessoas estão trabalhando normalmente, mesmo com tudo ao nosso redor dizendo para que a gente fique em casa. São serviços considerados essenciais como mercados, farmácias e hospitais, mas também são pequenos empreendedores que recusaram fechar as portas e em meio à pandemia abrem suas lojinhas de 1,99 e de bijuterias. Por outro lado, muitos lugares que aderiram a quarentena tiveram que demitir seus funcionários e lá se vai aquilo que poderia ser a única fonte de renda de uma família, e que enquanto estivermos vivendo essa pandemia, essa renda não será reposta, o que já torna maior o número de desemprego no país. Para os que estudam, em escolas ou faculdades, é exigido que se possuam acesso a internet e para aqueles que não acessam o portal, não fazem atividade, e nem comparecem às aulas é dado falta e pode resultar em reprovação ao final do ano ou semestre.

Trabalhar em home office não é nem uma opção dentro de uma casa onde a mãe é a chefe de família e passa o dia sem folga, fazendo tarefas de casa, cuidando de filhos e pensando em alternativas para se virar durante esses tempos de escassez. Estudar a distância não é nem uma opção dentro dessa mesma casa em que o filho não tem computador e nem rede wifi, onde esse mesmo filho precisa se expor sem proteção a coleta de papelão e latinhas para ajudar dentro de casa.

Estamos imersos e imersas em nós, enquanto pessoas lá fora estão imersas no desespero. Estar de quarentena não permite que nós enquanto cidadãos olhemos para o lado e ao ver a mão de alguém, não sejamos apoio. Enxergar nossos pequenos privilégios e trabalhar para que o pouco que se tem seja compartilhado, é o que fará com que nos tornemos pessoas mais atentas às desigualdades e esse é um entendimento extremamente importante para vivermos em sociedade após a pandemia.

 

*Selva é atriz, escritora, violonista e arte-educadora partindo sempre da perspectiva da mulher enquanto gênero, mulher preta enquanto gênero e raça, e mulher preta periférica enquanto gênero raça e classe. Usando as palavras para absorver e compartilhar conhecimento na zona leste de São Paulo

 

 

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