Transfobia, misoginia e racismo nas redes: a urgência da participação de mulheres negras na regulação das plataformas

Imagem: Getty Images

Por Laila Oliveira*

Nos últimos meses, decisões unilaterais de CEOs como Elon Musk (X/Twitter) e Mark Zuckerberg (Meta/Facebook e Instagram) têm reacendido o debate sobre os impactos das redes sociais na democracia, na segurança digital e nos direitos humanos. Enquanto isso, grupos historicamente marginalizados — como mulheres negras, pessoas trans e comunidades periféricas — seguem excluídos dos espaços de decisão sobre a governança da internet, embora sejam os mais afetados por suas violências.

Discussões sobre direitos digitais não são novas. Avanços como o Marco Civil da Internet (2014) criaram diretrizes importantes, mas não são suficientes. Segundo dados divulgados SaferNet, a misoginia segue sendo o mais denunciado, no 1º semestre de 2022 chegou a 7096 casos. 

Mulheres negras na vanguarda do ativismo digital (mas fora dos espaços de poder)

A presença de mulheres negras nas tecnologias digitais é histórica, mas sistematicamente apagada. Organizações como Geledés (que desde 1998 atua na inclusão digital da população negra) e coletivos como Blogueiras Negras e Olabi/PretaLab foram pioneiros no uso da internet para combater desigualdades. Suas estratégias incluem desde campanhas de conscientização até a criação de ferramentas de denúncia, como o Mapa do Acolhimento, que conecta vítimas de violência a redes de apoio.

A violência como tática de silenciamento

O caso da deputada federal Erika Hilton (PSOL) ilustra o custo dessa exclusão. Em 2025, ao denunciar a transfobia do governo dos EUA (que se recusou a reconhecer sua identidade de gênero no passaporte), a parlamentar foi alvo de uma enxurrada de ataques racistas e transfóbicos nas redes. A GloboNews noticiou o fato mas os comentários sob a postagem foram inundados por discurso de ódio — um padrão que se repete sempre que mulheres negras e trans ocupam espaços públicos.

Imagem: Reprodução no Instagram da Globo News. 

O discurso de ódio responde os números alarmantes: o Brasil lidera o ranking de assassinatos de pessoas trans pelo 14º ano consecutivo (dados da ANTRA, 2023). 

Enquanto isso, plataformas retrocedem em proteções. Em 2023, a Meta reduziu em 60% seus investimentos em moderação de conteúdo (Global Witness), desativando filtros que protegiam pessoas negras e LGBTQIA+. 

Iniciativas importantes têm acontecido na contracorrente das violências. A campanha “Tire Meu Rosto da Sua Mira” é uma delas. Realizada pela Coalizão Direitos na Rede em parceria com outras organizações, têm denunciado como sistemas de reconhecimento facial — adotados por governos têm viés racista: pessoas negras têm mais chances de serem identificadas erroneamente. Mesmo assim, essas tecnologias seguem sem regulamentação específica.

Diante desse cenário, é urgente que o Legislativo e o Executivo brasileiro incluam, em debates sobre regulação, medidas como cotas para participação de mulheres negras e trans na construção de políticas que contribuam para uma governança da internet que assegure direitos. 

*Jornalista, mestra em comunicação (UFS), doutoranda em Sociologia (UFS) e Estudos Étnicos e Africanos (UFBA). Atua na Auto-Organização de Mulheres Negras de Sergipe Rejane Maria. Mãe de Enzo e Bento 🌿

** Este é um artigo de opinião que está dentro da nossa política editorial, mas não reflete necessariamente o posicionamento da Revista Afirmativa

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