Condenações, documentário e ataques: o maio em que Vini Jr. se mantém símbolo de resistência negra

Jogador brasileiro tem mês marcado por sentença inédita por crime de ódio, lançamento de documentário e mobilização racista por silenciamento
Brasília (DF), 20/03/2025 - Jogador Vini Jr durante lance de jogo de futebol entre Brasil e Colômbia válido pelas Eliminatórias da Copa do Mundo. Foto: Bruno Peres/Agência Brasil

Por Catiane Pereira* 

O mês de maio marca um ponto de virada simbólico, e contraditório, na luta do atacante brasileiro Vinícius Jr. contra o racismo no futebol. Entre o lançamento de um documentário que expõe sua trajetória e condenações de torcedores rivais na Espanha por ofensas racistas, o atacante brasileiro continua sendo alvo de violências, ameaças e tentativas de silenciamento. Mesmo assim, sua presença no futebol e na mídia segue inegociável, potente e negra. Confira, a seguir, um resumo produzido pela Afirmativa do que maio proporcionou ao jogador:

Espanha condena torcedores por racismo contra Vini Jr.

Na última quarta-feira (21), a Corte Provincial de Valladolid, na Espanha, condenou cinco torcedores a um ano de prisão por ofensas racistas contra o jogador brasileiro ocorridas durante uma partida. Essa foi a primeira vez que uma sentença na Espanha reconheceu insultos racistas em estádios como crime de ódio, com base no artigo 510.2 do Código Penal espanhol.

Os ataques contra Vinícius ocorreram em dezembro de 2022, durante a partida entre Real Madrid e Real Valladolid, pela LaLiga. O jogo foi no estádio José Zorrilla. Vinícius, jogador do Real Madrid, foi substituído nos minutos finais. Depois de sair do campo, ele comemorou um gol perto da área onde estavam os torcedores do time adversário e foi atacado.

A decisão homologou a sentença expedida no dia 15 de maio pelo Ministério Público espanhol, que condenou os torcedores a um ano de prisão, multa entre 1.080 e 1.620 euros e proibição de trabalhar com educação, esportes ou atividades de lazer por quatro anos. 

No entanto, a decisão não será cumprida de imediato — é uma sentença suspensa. Isso significa que os torcedores só irão para a prisão se descumprirem duas regras: não cometer nenhum novo crime e não entrar em estádios de futebol por três anos.

De acordo com a legislação da Espanha, pessoas condenadas por crimes não violentos com penas menores que dois anos — e que não tenham antecedentes criminais — geralmente não cumprem a pena na prisão, mas ficam em liberdade condicional. Foi o que aconteceu com os cinco torcedores condenados.

Esse não é um caso isolado: outros torcedores também já foram responsabilizados por ataques racistas ao jogador. Em junho de 2024, três torcedores do Valencia foram sentenciados a oito meses de prisão. Já em setembro do mesmo ano, um torcedor do Mallorca recebeu pena de um ano, mas também com suspensão condicional.

Vini Jr presta depoimento sobre ataque racista em Madri

No dia 19 de maio, em depoimento prestado por videoconferência, Vini Jr. afirmou temer pela sua vida e de sua família ao ver, em 2023, um boneco com sua imagem pendurado em uma ponte de Madri, simulando um enforcamento. O ato está sendo julgado este ano. O jogador relatou que viu a cena pelas redes sociais e considerou o episódio motivado por racismo e ódio, tanto por ele ser negro quanto por representar o Real Madrid.

Os quatro homens acusados pelo ato são julgados por crimes contra os direitos fundamentais, a dignidade e por ameaças incondicionais. O Ministério Público espanhol pede quatro anos de prisão e uma indenização de € 6.000 por danos morais ao jogador. A audiência principal está marcada para 23 de junho, data em que Vinícius não poderá comparecer por conta do Mundial de Clubes. Antes disso, haverá uma audiência preliminar em 16 de junho, na qual há possibilidade de acordo entre acusação e defesa, desde que aceito por todos os réus.

Relembre o caso: Em janeiro de 2023, um boneco vestido com a camisa do jogador do Real Madrid foi pendurado em uma ponte em Madrid, simulando um enforcamento. Acima do boneco, uma faixa com os dizeres “Madrid odeia o Real”, frase associada à torcida organizada do Atlético de Madrid, reforçou a autoria do ato. 

Lançamento do documentário ‘Baila, Vini’

No dia 15 de maio, estreou o documentário “Baila, Vini”, lançado pela Netflix, que oferece um retrato íntimo do jogador brasileiro, revelando não apenas sua trajetória como astro do futebol, mas também aspectos pessoais pouco conhecidos. 

Imagem: Reprodução Netflix

Com cenas registradas entre 2023 e 2024, além de conteúdos inéditos do acervo pessoal de Vini Jr., o documentário revela como a postura vibrante e desafiadora do jogador em campo se transformou em um símbolo global de resistência ao racismo. Em 1h40 de duração, a produção vai além do craque do Real Madrid e apresenta o jovem de São Gonçalo que carrega o sonho de conquistar o mundo com a camisa da seleção brasileira.

A produção também aborda os ataques racistas sofridos pelo jogador na Espanha, em especial o episódio marcante no estádio Mestalla, em uma partida entre Real Madrid e Valencia,  em 2023.

Tentativa de boicote ao documentário de Vini Jr

O documentário “Baila, Vini” virou alvo de uma mobilização negativa nas redes sociais. Influenciadores brasileiros notaram uma campanha coordenada por usuários estrangeiros, principalmente de língua espanhola, que orientavam o público a dar notas baixas ao título no IMDb, site especializado em crítica de cinema. Circulavam frases como “é dever moral de todos entrar no IMDb, buscar ‘Baila, Vini’ e dar nota 1”. Como resultado, a avaliação da produção despencou para 2,2 no dia 17 de maio.

Com a denúncia da tentativa de boicote, a nota subiu para 3,8 até a segunda-feira (26/5), somando mais de 29 mil avaliações. A ofensiva levantou questionamentos por parte de comentaristas esportivos como Marco Marconi sobre as motivações racistas do ataque. 

No dia 19 de maio, além do ataque à produção nas redes sociais, o Valencia pediu uma correção à produtora do documentário, por conta de uma cena que associa a torcida do clube a insultos racistas contra Vini Jr. durante a partida em maio de 2023, já mencionada neste texto. No trecho exibido, ouve-se a torcida gritando “mono, mono” (macaco, em espanhol) enquanto o jogador aparece em campo. Segundo o clube, no entanto, o que foi dito nas arquibancadas foi “tonto, tonto” (“bobo”). Na época, o Valencia prometeu banir os responsáveis, mas também acusou Vini Jr. e o técnico Carlo Ancelotti de generalizar os ataques à torcida inteira. Desde então, a presença do jogador em Valência tem gerado tensão.

Torcedor do Barcelona usa blackface para atacar Vini Jr

No dia 15 de maio, durante a celebração do título do Barcelona na La Liga, um torcedor gerou polêmica ao aparecer com o rosto pintado de preto, prática conhecida como blackface, em uma tentativa de ridicularizar o jogador brasileiro. Usando uma camisa branca com o número zero e o nome “Ficticius” estampado nas costas, o homem fazia alusão ao atleta como se seu talento fosse fictício. A atitude foi registrada por uma mulher negra, que o confrontou e compartilhou o vídeo nas redes sociais. Apesar da denúncia, os presentes não reagiram, e o caso repercutiu na internet, reacendendo o debate sobre o racismo no futebol e a ausência de criminalização da prática na Espanha.

O blackface tem origem nos Estados Unidos do século 19, quando artistas brancos pintavam o rosto de preto para interpretar personagens negros de forma caricata e ofensiva. Na Espanha, o cenário legal ainda não contempla o blackface como crime, apesar da crescente mobilização contra atitudes discriminatórias.

Com informações do UOL, Globo Esporte e A Tarde* 

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