Defensoria Pública realiza audiência para discutir violência policial na Bahia

Polícia baiana ocupa o primeiro lugar em mortes. Mesmo convidados, Polícia Militar e Ministério Público não enviaram representantes
Ana Maria, mãe de Pedro Henrique, assassinado em casa após denunciar uma agressão realizada por agentes policiais - Imagem: Mateus Medina

Por Matheus Souza

A Defensoria Pública da Bahia (DPE/BA) realizou na manhã da última sexta-feira (30), no auditório da Faculdade de Direito da UFBA, em Salvador (BA), uma audiência pública a fim de debater o problema da letalidade policial na Bahia. A mesa, presidida pelo coordenador de Direitos Humanos Alex Raposo, contou com a presença de representantes do poder público e movimentos sociais, além da participação da sociedade civil. 

A reunião começou com o depoimento de Luzia Cerqueira Santos, mãe de Victor Cerqueira Santos Santana, conhecido como Vitinho, jovem negro que foi assassinado durante uma operação policial em Caraívas, no sul da Bahia, em maio deste ano. Emocionada, ela desabafou sobre a morte do filho. “Em 10 de maio, a vida do meu filho foi ceifada. Eles [polícia] dizem que estavam atrás de dois bandidos de alta periculosidade, e que um deles acabou sendo confundido, mas não foi isso que aconteceu. Quem eles estavam procurando era branco, e o meu filho tinha pele escura”. Três dias antes de ser morto, Victor havia ido à delegacia registrar uma ocorrência por injúria racial.

Logo depois, Ana Maria,  mãe de Pedro Henrique, contou aos presentes a trágica morte do rapaz, assassinado a tiros em 2018,  em casa, por três homens encapuzados que invadiram o imóvel. O jovem negro, tatuador e ativista pelos dirietos humanos, havia sido agredido em 2012, durante uma abordagem policial. Após Pedro denunciar o ocorrido ao MP-BA – e fundar a Caminhada da Paz, ato em defesa dos Direitos Humanos e contra a violência policial – a mãe do jovem conta que as perseguições começaram. 

“Logo depois da audiência na justiça, em 2013, na saída do fórum, Pedro foi ameaçado pelo oficial que comandava a guarnição que o violentou. Ele disse que aquilo iria sair muito caro, e realmente foi o que aconteceu; as perseguições se iniciaram em 2014 e só pararam em 2018, com o seu assassinato”, relata Ana Maria. O caso aconteceu na cidade de Tucano, a 260 km de Salvador, e ganhou repercussão internacional.

A mesa contou com representantes do poder público, movimentos sociais e sociedade civil – Imagem: Mateus Medina

A PM baiana é a mais letal do país

Segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a Bahia ocupa o primeiro lugar no número de mortes por policiais. Em 2022, o estado ultrapassou o Rio de Janeiro com o maior número de mortes por policiais (1.4641). No ano seguinte, a posição foi mantida e o estado contabilizou 1.699 mortos em intervenções policiais. Entre as dez cidades em que a polícia mais matou no Brasil, cinco ficam na Bahia: Jequié (1º), Eunápolis (4º), Simões Filho (7º), Salvador (8º) e Luís Eduardo Magalhães (10º).

Sob fortes manifestações contrárias da sociedade civil presente, a delegada Simone Moutinho, representante da Secretaria de Segurança Pública, declarou que houve uma redução da letalidade policial no estado após a instalação das câmeras corporais.

“As corregedorias estão sendo severas e rigorosas com os excessos. Porém, não podemos esquecer: policiais também são seres humanos, que acordam todo dia, como eu, para proteger a vida de outros seres humanos. O racismo, assim como o machismo, é da estrutura da nossa sociedade”, defendeu.

Tailane Araújo, do Instituto Fogo Cruzado, refutou algumas das informações apresentadas pela Secretaria de Segurança Pública. Citado pela delegada Moutinho, o CLI (Crimes Letais Intencionais) apesar da queda, não inclui dados por morte em decorrência de operações policiais. “São mortes que você não consegue encontrar disponíveis nos portais da Segurança Pública da Bahia”, declara Tailane. “É muito problemático o fato do estado da Bahia não publicar informações que são de interesse público. Como jornalista, eu sempre tive muita dificuldade de apurar dados da violência policial. Gostaríamos de uma resposta quanto a isso”, completa.

Gabriela Ramos, coordenadora do Instituto Odara e do programa “Minha Mãe Não Dorme Enquanto Eu Não Chegar”, que denuncia o genocídio da população negra, também questionou a falta de transparência do estado no repasse de dados para a imprensa e população. “Dados são um grande calcanhar de aquiles para a Secretaria de Segurança Pública”, afirmou. Entre os questionamentos, a coordenadora indagou, “o que há na política de segurança pública na Bahia além da repressão? Tenho muita curiosidade, pois toda atividade que nós fazemos sobre segurança pública acabamos falando de polícia e repressão. Parece não haver outro repertório”.

Convidados para participar da audiência, a Polícia Militar e o Ministério Público não enviaram representantes.

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