Por Patrícia Rosa
Mais de 100 indígenas ocupam a sede da Secretaria de Educação do Pará (Seduc) em Belém, desde a última terça-feira (14). Os manifestantes reivindicam a manutenção do modelo atual do Sistema Modular de Ensino (Some) na educação escolar indígena do estado. Os indígenas pedem a anulação da Lei 10.820/2024, aprovada em dezembro do ano passado, que traz mudanças no estatuto do magistério, entre elas a revogação do Projeto de Lei 7.806/2014, que regulamenta o funcionamento e manutenção do Some. Esse modelo atende comunidades distantes dos centros urbanos do Pará.
O Some foi implementado na década de 1980. Com as mudanças previstas no formato de ensino, o sistema presencial seria substituído pela modalidade de Ensino à Distância (EAD), utilizando centrais de mídia. Na estrutura original, professores se deslocam para comunidades afastadas, permanecendo por dois meses, em regime de rodízio. O sistema funciona em parceria com gestões municipais.
Alessandra Korap, coordenadora da Associação Indígena Pariri, afirmou que o novo sistema configura uma violação de direitos e um descaso com os povos indígenas, suas línguas e culturas.
“Imagine os alunos que saem da aldeia para estudar pela TV, sendo que muitos não falam português, apenas suas línguas indígenas. O Pará tem mais de 50 povos indígenas com línguas falantes que não entendem o português. Essa lei prejudicará muitos alunos”, declarou Korap. Ela também relatou que a polícia militar utilizou spray de pimenta contra os manifestantes, além de cortar os serviços de energia e água no prédio.
O cacique Dada Borari, da Terra Indígena Maró, publicou um vídeo nas redes sociais explicando ao policial militar que a manifestação é pacífica. “Não viemos brigar nem danificar nada, mas trazer nossas demandas e mostrar que essa decisão contribui para a morte escolar indígena no estado”, afirmou.
O Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras em Educação Pública do Estado do Pará (SINTEPP) se manifestou através de nota. A categoria fala sobre a falta de estrutura das instituições.
“A grande maioria das comunidades indígenas do Estado não contam com a infraestrutura necessária para a substituição e tal ação do governo é uma grande farsa, pois além da falta de estrutura mínima não existe nas comunidades energia elétrica suficiente e nem sinal de internet”, diz trecho da nota. O sindicato realizará uma assembleia nesta quinta-feira (16) para avaliar a possibilidade de decretar estado de greve na educação do Pará.
A deputada estadual Lívia Duarte (PSOL/PA) também se manifestou, alertando sobre o impacto do corte de gratificações na educação indígena. “O governo Helder desmontou a educação no campo, retirou gratificações e impediu que professores chegassem às aldeias para realizar seu trabalho. A luta é para que o governo ouça os parentes indígenas”, declarou a parlamentar, que protocolou ofícios destinados ao ministro da casa civil Rui Costa, para Sônia Guajajara ministra dos povos indígenas e Macaé Evaristo dos direitos humanos, pedindo a intervenção federal na busca por soluções para a educação indígena.
Em nota publicada em 3 de dezembro, a Seduc negou a extinção do sistema e afirmou que as áreas atendidas pelo Some continuarão a ser contempladas, ouvindo as comunidades para definir estratégias de atendimento.
A Revista Afirmativa entrou em contato com a Seduc do Pará para esclarecer como a modalidade à distância será implementada, mas não obteve resposta até o fechamento da matéria. Segundo o Censo Demográfico de 2022, o Pará possui cerca de 80.974 indígenas.